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quinta-feira, 2 de maio de 2013

De delinquentes linguísticos e a logopédia necessária.





Por José Manuel Barbosa

Quando a dia de hoje uma pessoa de qualquer país da Lusofonia oficial e um galego têm de se comunicarem entre sí, podem acontecer várias cousas:

a)      Que o paleofalante galego sinta que percebe e pode ser percebido pelo seu interlocutor. Neste caso, o galego reproduz a sua fala dialetal local oferecendo uma margem de distância mínima que a dia de hoje pode não ajudar a total fluidez comunicativa entre as partes. Isto, até o século XX não acontecia, justo até o século em que a Galiza contou com uma versão normativizada da sua língua e uma política linguística que promocionou sempre uma língua “ausbau” diferente da de Portugal. Este relacionamento a duas partes, galego por um lado e português por outro, é o caso habitual que acontece no dia-a-dia nas regiões da raia galego-portuguesa onde nunca houve problemas de relacionamento nem nunca se sentiram “estrangeiros” os uns a respeito dos outros. A distância viria dada porque o português está formado numa língua padrão saída dum determinado centralismo lisboeta e o galego (mal)formado tanto em castelhano como em “galego”. Este caso está em vias de extinção, como indicou a UNESCO a princípios dos século, por serem cada vez menos os paleofalantes os que sentem o português como uma continuação das suas falas e por ser mais os portugueses (e outros lusófonos) os que sentem os galegos como mais uns “españoles” de fala castelhana, nos quais não há que confiar desconhecendo a nossa identidade comum.

b)      Que o galego, duma maioria cada vez menos minoritária, fale em castelhano. Nesse caso pode acontecer que o lusófono faça esforço por se adaptar ao outro parceiro, embora há de ser difícil que este último, se adapte ao primeiro, quer por um sentir xenófobo e supremacista incutido pelo castelhanismo, quer pela educação deficiente que na Espanha se ministra em relação às línguas, forem estas de dentro como de fora do Reino. Algo assim acontece nos países anglófonos por terem a ideia de que todo o mundo tem o dever de saber inglês...No Reino, considera-se uma cousa normal que os demais têm o dever de os perceberem em castelhano embora não à inversa sob pena de ser considerado um ignorante. A maior parte das vezes, o espanhol em questão está capacitado para perceber pela pouca distância linguística que há entre a deles e a outra mas finalmente acontece que é um problema de vontade. O espanhol não quer perceber...e o galego-espanhol como subproduto deforme e acomplexado que reproduz ridiculamente os hábitos “cañís” e por um elemento de mimetismo primate copia os comportamentos mesquinhos do modelo espanholista à moda, de caráter intolerante e impositor, fornecido pelos média embora com menos força do que os originários.
 c) Que o galego, quer paleo, quer neofalante, adopte a variante RAG na sua conversa com o lusoparlante. Neste caso o resultado final vai ser que este  perceba a fala do galego como um péssimo português ou que é um espanhol que tenta fazer esforços por falar português. Nesse caso para favorecer o relacionamento acaba por tentar ele falar em castelhano. Ainda assim....o galego-RAG pode insistir na proximidade linguística galego-portuguesa o que resulta absurdo para o lusófono que percebe a fala do galego como uma trapalhada que não há por onde apanhá-la.

Estes são três dos quatro casos possíveis que se podem dar. O que ninguém fala é das circunstâncias que levam a estas irregularidades intercomunicativas, tendo em conta que nem os políticos nem os linguistas que fazem parte das administrações galegas ignoram que as falas galegas e luso-brasileiras fazem parte do mesmo diassistema linguístico... e quando digo que eles “sabem” isso, não estou a dizer que “acreditem” ou que “tenham uma ligeira intuição”. Digo simples e diretamente “sabem” com tudo o que isso implica e compromete.
A pesar de tudo, a princípios dos anos 80 e por decisão política, os responsáveis da administração optavam por oferecer ao administrado galego uma versão normativa para a sua língua que facilitava (e ainda facilita no presente) a distância e favorece o mais alto grau de incomunicação entre galegos e o resto dos lusófonos. Essa versão foi aplicada por decreto para ser aplicada em aqueles âmbitos da vida fulcrais para incutir a ideia de diferença, como é o caso do ensino à vez que faziam orelhas moucas à discrepância legítima de tal forma que nenhum professor pudesse fugir de tal despropósito, castigando a todos aqueles que no exercício da sua liberdade de cátedra optassem por querer transmitir aos alunos uma ideia de identidade linguística galego-portuguesa ou no mais duro dos casos uma versão útil da língua.
Os professores, mesmo não ensinando outra normativa diferente à imposta por um decreto nunca consensuado eram perseguidos, discriminados, desrespeitados como pessoas e sobre eles era exercido um subtil “mobbing” dificilmente demonstrável entre outras cousas porque o claustro de professores do centro de ensino apoiava a ação, quer porque a sua formação linguística não permitia aceder a registos mínimos de conhecimento, quer porque a sua má formação humana e/ou ética os fazia incapazes de frear a ação agressiva contra o acossado, quer por medo a que sobre eles caísse também a repressão. 
Uma outra forma de “mobbing” que não afetasse diretamente à administração era deixar que o protesto “anti-lusista” fosse levado a cabo pelos país das crianças que sentiam que um “lusista” não ministrava as suas aulas como era o convencional. Nestes casos a equipa diretiva ou o claustro lavavam-se as mão de cara ao afetado mas encirrava aos pais ocultamente para apagar a dissidência. Tudo isto sem informar a ninguém que os professores possuíam e possuem legalmente o direito à liberdade de cátedra e que ainda um artigo da Constituição espanhola garante na teoria a não discriminação por qualquer circunstância pessoal e social...e portanto por qualquer razão linguística o que faz que não exista legalidade que defenda uma discriminação por razões de normativa linguística a usar com qualquer língua oficial.
Alguns casos foram muito sonoros na Galiza dos 80 e dos 90, épocas muito obscuras de regressão linguística em Galiza. Lembro dous casos especiais por se saltarem todas as linhas vermelhas do silêncio, do ocultamento  e da censura. Foram protagonizados e sofridos pelos professores Mário Afonso Nozeda e Jesus Sanches Sobrado. Este último reformado ao pouco tempo de começar a trabalhar por causa dum ambiente laboral totalmente hostil  que o levou a uma situação de estress por “mobbing”.

Por outra parte, e deixando o acosso favorecido pela administração ao que sempre estivemos submetidos os defendores da língua na Galiza, temos que acrescentar que a forma em que as aulas de “galego” se dão ainda nos dias de hoje é própria duma administração que não se importa em deformar às crianças e aos adolescentes, contrariamente ao cometido último que tem o ensino, que é formar e informar (não deformar).
Existiu sempre uma ampla percentagem de professores que não consideraram como opção válida a de começar o ensino da lecto-escritura das crianças na sua língua raiz. Cousa nunca combatida pela administração galega e mesmo impulsionada desde a “Xunta”. Nenos e nenas galaico-parlantes apreenderam e apreendem a ler e a escrever em castelhano, vendo o seu idioma relegado aos usos mais coloquiais ou simplesmente deixando-o para assuntos menores. Muitos professores são mal formados linguisticamente, com índices de conhecimento da realidade socio-linguística deficientes, com prejuízos anti-galegos ou que consideram a língua do País como um elemento de menor importância na formação dos alunos. A causa provém da sua formação universitária originada nos planos de estudo que incutem esses defetos aos futuros professores. Da administração galega parte a permissividade a considerar normal atentar contra a integridade moral e psicológica de um companheiro se este mostra sinais de “lusismo patológico” ou qualquer outro desvio legítimo em qualquer país democrático, à vez que se defende hipocritamente a liberdade do professor a saltar-se toda regra pedagógica de educar a um aluno na sua língua e de negar ao aluno o seu direito de ser formado na sua língua. 
 Na Galiza, como comentava há uns dias no PGL Fernão Portas estão-se a incumprir os dous princípios básicos do ensino quando neste há duas línguas presentes (português e espanhol....ou galego e castelhano se quisermos): “misturar e não marcar fronteira” favorecendo nos alunos o atrapalhamento linguístico podendo levar à necessidade da logopédia em alguns casos que optarem por usar a língua em público. Curiosamente aqueles que optam pelo logopeda para poderem sair num meio de comunicação público são “re-educados” para poderem falar corretamente o castelhano....nunca a língua dos galegos.
É a vontade da administração fomentar a bablização nos galegos em vez da competência nas duas línguas, cometendo um grave delito, talvez não só moral, pois demonstrada a sua intencionalidade de atrapalhar à sociedade investindo grandíssimas sumas de dinheiro público em “normalizar” o galego se obtenha como resultado final a mais alta deserção da língua nos últimos trinta anos dos últimos cinco séculos. Dito de outra forma: houve mais desgaleguizados e castelhanizados desde 1980 até hoje do que entre 1480 e 1980. A perda foi de mais dum 30% desde que chegou o PP à “Xunta” autonómica. Não são os meus dados, são dados das Universidades Galegas, das Instituições (a)normalizadoras dependentes da “Xunta” e da UNESCO.
Esta sociedade leva já muitos anos seguidos sob um regime de ignomínia, abuso, desnacionalização e corrução de todo tipo que afeta a todos os aspectos da vida dos galegos, nomeadamente a parte linguística que é da que estamos a falar, e nunca ninguém denunciou perante a justiça galega, espanhola, europeia ou internacional  a situação que vivemos de genocídio cultural, económico, evidentemente linguístico...e com a emigração favorecida pelo poder, também me atrevo a dizer que genocídio étnico. Este genocídio é subtil e em parte consentido pela ignorância e a estupidez de muitos mas também pelo colaboracionismo de outros que bem mereceriam que a justiça também caísse sobre eles. Por isso os políticos no poder desde os aos 80, momento em que se constituiu a infelizmente denominada “Comunidad autónoma Gallega”, são uns delinquentes só um ponto por baixo dos grandes genocidas da história. O único que os diferencia é que estes últimos recorreram ao sangue, à guerra e ao fogo...os nossos não precisam disso porque há muitos galegos que os votam e que favorecem a bastardia moral e política de quem leva a cabo o processo.
Falávamos acima de três dos casos nos que um galego e um lusófono poderíam interagir comunicativamente. Há um quarto caso...:
  d) O galego tem consciência de falar a mesma língua do que o outro lusófono. Nesse caso a comunicação é fluída porque a inteligência desse galego faz com que a sua fala seja mais próxima, compreensível e universal sem deixar de ser galego. Em vez de usar “irmán” usa “irmão”; em vez de usar “oir” usa “ouvir”; em vez de usar “caer” usa “cair”, em vez de usar “dicir” usa “dizer” em vez de acabar certas palavras em “-ble/bles” acaba em “-vel/veis”; em vez de usar a terminação “-ción/cións” usa a “-ção/ções” comum a todo o universo galego-português que não por perdida na fala diária é menos galega. Também provavelmente recupere a sua fonética com o uso do sesseio tão legítimo como qualquer outra forma absolutamente galega e limpando um elemento fónico de origem castelhana como é o denominado “cetacismo”... Um galego reintegracionista pode andar com o seu galego pelo mundo, pelos organismos internacionais sem sair da sua fala matriz. A sua fala é reconhecida como uma das mais importantes e sucedidas da humanidade, é respeitado e dignificado por distinguir corretamente o seu galego(-português) do castelhano e não seguir o fomento da mistura ensinado nas escolas e liceus galegos...e o que é melhor de tudo é que esse galego reintegracionista nunca deixa de falar galego quando usa a versão internacional da língua. Com essa forma de apresentar as cousas saberá falar corretamente a sua língua sem castelhanizá-la e se quiser falar castelhano poderá falá-lo também sem interferências. Os logopedas não serão necessários mas sim talvez um tribunal de justiça, não sei se nacional ou internacional que julgue os mafiosos da língua por crimes contra a dignidade deste povo pelo qual nem deixaremos de lutar nem renunciaremos de pertencer a ele.


6 comentários:

maybaris1 disse...

Pois eu falo o galego galego, suponho que peco de purista pero é sabido que é un idioma, e ten tanta riqueza que non lle fai falla a axuda doutro idioma, nin do español nin do portugués, il só é a perfezón.

O disse...

Parabéns!
Escrever à espanhola é uma opção, mas evidencia falta de independência.
Ainda mais: se o falar é rico em por ele, não há razão para utilizar expressões espanholas, como "pecar de", quando há formas genuínas como "pecar por".

Xico da Chaeira disse...

Parabéns polo artigo!
Bem certo é que em 98% dos casos, aproximarse do português não é corromper a língua galega senão limpá-la, restaurá-la e dar-lhe o esplendor que outrora teve. Dizer quarta-feira em vez de Jueves ou o híbrido Xoves, não é copiar por copiar do português, é ser esperto e utilizar as outras variantes da nossa língua, ainda hoje muito vivas, como tijolo para preenchermos os lugares vagos que após mais de cinco séculos de pressão , proibição e humilhação o castelhano leva feito na nossa variante do diassistema galaicoportuguês.

VIVA O GALAICO, VIVA O PORTUGUÊS, VIVA O GALAICOPORTUGUÊS!

Estou/Estom - Sou/Som - Dous/Dois -Tessoura/Tessoira... disse...

As galegas temos a sorte de ter espalhadas polo mundo inteiro "cópias de segurança" da nossa língua. Lá podemos ir e apanhar quando precisemos pra renascer ainda que fosse das cinças.

Anónimo disse...

Galiza ten lingua de seu e non podemos estar ollando si é un mal portugués para eles . Eso é esquizofrénico .É o noso resultado histórico e avante con el. Non ao Acordo .Lusofonia non , galegofonia . Non ao Acordo .

Anónimo disse...

Claro que Galiza tem "língua de seu" mas esta está espalhada por um espaço mais amplo do que a Galiza autonómica e as zonas estremeiras. A esquizofrenia carateriza-se pela dupla personalidade... se esta é galaico-castelhana sei-que não é esquizofrenia mas se o galego se recupera botando mão a uma variante de si próprio como é a variante portuguesa da nossa língua isso sim é esquizofrenia.... Curioso.
Isso sim é esquizofrénico é aliás paranóico.

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