Um antigo escrito irlandês do Ciclo de Ulster conta uma velha história ao redor do tenebroso tempo do Samhain. O mítico relato fala-nos do Echtrai Nerai. A aventura de Nera. Esta história é um velho legado que fala das aventuras dum valente guerreiro celta. Mas isso sim, ainda que semelhe velho e longínquo, chegaremos a ver como os sucessos que descreve encaixam com o velho Sámanos galaico e o Magusto atual. As portas do além estão abertas, vejamos o que nos trazem...
“A noite do Samhain chegara ao reino de Connacht e a Óenach desta celebração transcorria na Rát Cruachna. O rei Aillil e a rainha Mebd estavam presentes neste palácio. O rei dispus-se a pôr a prova a sua gente oferecendo a sua valiosa espada com empunhadura de ouro a em troca duma façanha. A sua espada seria para aquele que ousasse a pôr uma fita aos presos que foram executados no dia anterior. Os prisioneiros foram julgados e sentenciados a morrer enforcados durante a assembleia do Samhain.
Os presentes não puderam evitar a surpresa perante tal oferecimento pois aquela era uma noite muito perigosa e aterrorizante .Já sabemos que a barreira entre o mundo dos vivos e a dos mortos estava a esvaindo-se. Mas havia um valente guerreiro presente na celebração: Nera. Foi ele quem aceitou a proposta.
Nera coloca-se uma armadura e dirige-se ao lugar onde se acham os enforcados. Enquanto lhes colocava as fitas, um dos enforcados disse-lhe ao guerreiro que teria que levá-lo a beber. Nera aceita e o enforcado elogia o seu comportamento. Por causa disto, terá que levar o enforcado às suas costas até achar água para ele.
Seguidamente o guerreiro levou o enforcado para uma casa mas o defunto rejeitou entrar posto que esta estava rodeada por um lago de fogo. Continuaram até uma segunda, mas acharam-na rodeada por um lago de água, pelo que se vem obrigados a continuar. Chegaram a uma terceira casa, onde por fim, o defunto satisfez a sua sede. Após ter bebido o terceiro copo, o enforcado cuspiu sobre os rostos dos moradores da casa provocando neles a morte. Perante isto, o Nera devolveu-o a forca.
Nera retorna e vai na procura de Aillil, mas acha a fortaleza destruída pelas tropas do Sidh, o exército do Além. Nera após esta situação penetra na Cova de Chruachain, uma das entrada ao Sidh. Dentro, já, dá com as cabeças cortadas da gente da Rát Cruachna. O guerreiro é descoberto pelos habitantes do Sidh e para ficar, vai ver-se obrigado a fornecer lenha.
Com o tempo e antes do seguinte Samhain, a companheira de Nera no Sidh conta-lhe que viu uma imagem da destruição do Cruachna mas que não era real. O que Nera viu no Samhain era uma visão, uma premonição do que ia acontecer no próximo Samhain. Nera voltou com a sua gente chegando a receber a espada do rei. Mas o tempo que tinha passado no Sidh não se correspondia por excessivamente dilatado com o tempo no mundo dos homens. A sua gente foi advertida e preparam-se para atacar o Sidh quando se produzisse a nova apertura deste durante o Samhain. Os guerreiros de Connacht venceram aos do Sidh e conseguiram três importantes tesouros ainda que o valente Nera ia ficar no mundo do Além até o fim dos tempos”.
Como podemos comprovar nesta narração, Nera é um guerreiro que têm a capacidade de se deslocar entre o mundo dos vivos e o mundo dos mortos tal e como analisaremos. A etimologia do seu nome remete-nos a "força, grandeza" mas também a "chefe". No velho galês existe a palavra "nar", quer dizer, chefe. No gaélico "ner" significa javali, animal relacionado com a fortaleza e os guerreiros. Na antiga Kalláikia, ao sul do Cabo Fisterra, existia uma treba chamada "Neros" (Nerii em latim) relacionada também com este significado. Neros/Neroi provém do celta NERIOI que significa "virís, cheios de força masculina"; adjetivo de Neros "varão, macho". Há que apontar a que na narração do Echtra Nerai, o enforcado louva a Nera chamando-lhe "viril" por ajudá-lo. Neros/Neroi é o nome que se dava a si própria esta treba mas eram conhecidos por outras trebas com o nome de Supertamaricos em época latina, anteriormente como ALLOTAMARIKOI ou ALNOTAMARIKOI (As tribos calaicas, Higino Martins. p 191). Este povo, recebia o seu nome porque morava para além do Tâmara-Tambre, um rio temido, perigoso e relacionado com o além e a deusa tenebrosa. Segundo diz o Higino Martins na sua obra, essa é a origem do nome do rio, a designação de tenebroso... semelhante ao Hades, o escandinavo Gjallr, ou o rio de ondas negras que há que passar para chegar ao país do além: Tuoni. Nomenclatura similar recebe o famoso rio Tamisa de Londres.
Outro aspecto interessante de Nera é o facto de ter que atar aos enforcados. O facto de os atar, suporia que suas as Ânimas não poderiam abandoar o corpo que empregaram durante a sua vida. Mas a sua vez pode ter um sentido psycopompo, quer dizer, de levar as Ânimas de cara ao além. Este vinculo entre os laços e a condução das Ânimas ao outro mundo está presente no deus gaulês Oghmios (irlandês ogma) que possui uma cadeia que atravessa a sua língua e pela que leva aos homens atados pelas orelhas. Mas esta cadeia pode ser uma representação simbólica do seu caracter persuasivo e sábio. Oghmios têm a capacidade, portanto, de persuadir os homens e levá-los até os confins da terra.
O caracter das ligaduras e do seu carácter negativo como anudador da Ânima achamo-la nas crenças galegas atuais. Quando se produz um enforcamento, a gente evita falar da vitima, já que as Ânimas dos enforcados permanecem no lugar. Isto é devido a que o facto de se suicidar por meio duma soga, supõe que o seu espírito permanece na zona manifestando-se em ocasiões por meio de pequenas luzes que ficam no lugar. A aparição de destas luzes relaciona-se a uma morte violenta, aparecendo até que se abençoe o lugar ou se solucione o caso. Com estas crenças topou Vicente Risco: "No Castro de Caldelas suicidou-se umha pessoa e a pouco viram-se umas pequenas luzes no lugar do suicídio". Outro aspecto da mitologia galega é o da Ânima que se aparece para que lhe "rachem o hábito" e que a sua Ânima possa ser libertada. Mas há que ter cuidado, agindo contrariamente à recomendação do defunto no que diz respeito da forma de rachar, pois senão pode-nos levar com ele. No II Concílio de Braga, ano 572, fica interdito: "Não seja lícito aos bispos e padres fazer encantamentos e ligaduras".
O caracter das ligaduras e do seu carácter negativo como anudador da Ânima achamo-la nas crenças galegas atuais. Quando se produz um enforcamento, a gente evita falar da vitima, já que as Ânimas dos enforcados permanecem no lugar. Isto é devido a que o facto de se suicidar por meio duma soga, supõe que o seu espírito permanece na zona manifestando-se em ocasiões por meio de pequenas luzes que ficam no lugar. A aparição de destas luzes relaciona-se a uma morte violenta, aparecendo até que se abençoe o lugar ou se solucione o caso. Com estas crenças topou Vicente Risco: "No Castro de Caldelas suicidou-se umha pessoa e a pouco viram-se umas pequenas luzes no lugar do suicídio". Outro aspecto da mitologia galega é o da Ânima que se aparece para que lhe "rachem o hábito" e que a sua Ânima possa ser libertada. Mas há que ter cuidado, agindo contrariamente à recomendação do defunto no que diz respeito da forma de rachar, pois senão pode-nos levar com ele. No II Concílio de Braga, ano 572, fica interdito: "Não seja lícito aos bispos e padres fazer encantamentos e ligaduras".
2-Nera, Oghmios, Cuchulainn e os seus paralelismos na Kalláikia
No que diz respeito ao aspecto das ligaduras e da guerra aparece no "panteão" galaico na figura de Bândua. Um achado descoberto no acampamento romano de Banhos de Bande (Aquis Querquernis) remete-nos a uma representação dessa deidade que deu nome ao topónimo do concelho. Consiste numa figura dum deus guerreiro que apresenta uma corda atravessando o seu peito. Esse laço que envolve o seu peito corresponde-se com o de Oghmios e inclusivamente com o nome de Bândua os quais estám relacionados: *bhend, "atar" (A. Pena Granha). Essa anudadura supõe uma ligação, um vinculo entre as fratrias que lhe rendem culto. O seu nome aparece em relacionado em vários epítetos que denotam as suas qualidades: Aposolego "forte na vitoria", Cadogus "o lutador", Aetobrigus "a fortaleça dos fogosos" ou "fogosamente forte", Roudeacus "vermelho" (cor relacionado com os guerreiros) etc. O epíteto Aposolego é claro em relação à sua força na batalha. Citando a Blanca García-Fernández Albalat (1990, pp 185-1909; "A vitoria neste deus não seria mais que a derrota do inimigo após a sua imobilização imobilizando-lhe os membros com os seus laços mágicos" .Outra citação da mesma autora diz: “estão registradas estas capacidades que achamos nas divindades indo-europeias: a de atar, ligar, implícita no seu nome e a guerreira derivada dos seus epítetos e da "interpretatio". Por estas causas devemos deduzir, que existe alguma semelhança entre Bândua e este tipo de divindades. Ora bem, se é evidente que as comparações com os deuses dos laços no mundo indo-europeu dão explicação ao vínculo existente entre as ligaduras mágicas e a guerra, ainda permanecem sem resolver duas caraterísticas que atingem a Bândua: a confusão que se apresenta entre Marte e Mercúrio (39) e a relação com as comunidades. A primeira ao nosso entender só podemos resolvê-las no seio do panteão celta e a sua particular concepção da guerra e a magia. A segunda incógnita desvenda-se procurando de novo no seio das religiões indo-europeias, com o fim de pesquisar se os deuses dos laços dirigem a um grupo de gente determinado ou se é que se formam confrarias seguindo ou imitando os deuses dos laços”. No que diz respeito da sua posição, há que dizer que é um deus de primeira função ao modo do Odin germânico mas também se lhe atribui o aspecto obscuro da função soberana Dumeziliana. Bândua é um deus guerreiro mas também pode estar relacionado com a agua, de facto existem banhos termais na zona de Aquis Querquernis. A mesma relação pode estar presente em Bormánico, do proto-indoeuropeu “bhreue” (ferver, violenta efervescência). Mas temos de ter em conta que Bândua têm relação com Coso e com Marte, de facto foi identificado erroneamente com este último por desconhecimento dos arqueólogos ou historiadores. O deus aparece "recrutado" pelas tropas romanas por causa do seu carácter, testemunhado pelo epígrafe "Martis socio Banduae". Bândua e Coso são duas versões galaicas, ao meu ver, da mesma divindade. No caso de Coso, que aparece onde não aparece Bândua e ao invés, trata-se igualmente dum deus guerreiro mas também é um deus vinculado as aguas e à confluência destas. Este aspecto vemo-lo no seu "irmão" do Norte da Grã-Bretanha e França: Condatis. Estes aspectos aparecem claramente em Aquis Querquernis. Um deus guerreiro vinculado a fratrias galaicas que pertenceriam as tropas romanas mas também ao rio e a aguas termais. Isto não é estranho, pois muito do que se tem por romano na Gallaecia realmente é uma nova forma de se verem refletidas na cosmovisão galaica celto-atlântica: Novos jeitos de velhas formas.
A morte do grande guerreiro Cuchulainn em Muirthemne achega-nos um dado de muito interesse: Quando ao guerreiro irlandês lhe chegou a sua hora no campo de batalha é atado pela cintura a uma coluna de pedra. Morre assim o guerreiro dignamente, marcado o trágico final por um corvo que se pousa sobre ele. Esse corvo é Babd (da tríada de Morrigan e Macha), o mesmo corvo de mau agoiro para os galegos, essa velha deusa chamada na mitologia galega " A Lavandeira" que a sua vez tem relação com um pássaro. Achamos de novo a mesma simbologia vinculada à guerra e à última viagem guiada por Oghmios. Mas se analisarmos a história de Cuchulainn podemos tirar dados de interesse. O nome original deste heróico personagem era Setanta. Este, numa ocasião, de criança, foi visitar o seu pai adoptivo à casa do ferreiro Culann. Nesse momento, teve de se enfrentar ao cão do ferreiro, vendo-se na obriga de o matar. Setanta comprometer-se-ia a fazer de guarda a Culann por ocasionar a morte do seu cão e foi por isso pelo que adoptou o nome de Cuchulainn: o cão de Culann.
A morte do grande guerreiro Cuchulainn em Muirthemne achega-nos um dado de muito interesse: Quando ao guerreiro irlandês lhe chegou a sua hora no campo de batalha é atado pela cintura a uma coluna de pedra. Morre assim o guerreiro dignamente, marcado o trágico final por um corvo que se pousa sobre ele. Esse corvo é Babd (da tríada de Morrigan e Macha), o mesmo corvo de mau agoiro para os galegos, essa velha deusa chamada na mitologia galega " A Lavandeira" que a sua vez tem relação com um pássaro. Achamos de novo a mesma simbologia vinculada à guerra e à última viagem guiada por Oghmios. Mas se analisarmos a história de Cuchulainn podemos tirar dados de interesse. O nome original deste heróico personagem era Setanta. Este, numa ocasião, de criança, foi visitar o seu pai adoptivo à casa do ferreiro Culann. Nesse momento, teve de se enfrentar ao cão do ferreiro, vendo-se na obriga de o matar. Setanta comprometer-se-ia a fazer de guarda a Culann por ocasionar a morte do seu cão e foi por isso pelo que adoptou o nome de Cuchulainn: o cão de Culann.
O professor André Pena Granha diz ao respeito: "Setanta "Caminhante" e "Ogmios" o caminho são uma mesma coisa, representa ao solar deus no seu decadente e psychopompos aspecto. A acidental' morte do cão de Culann intensifica o caracter psychompompos. A última fase do Deus, como a de Odin, é a sua morte, defendendo aos seus colegas. Tanto se ata à árvore para morrer lutando, quanto os seus laços servem logo para arrastar aos seus colegas caídos em combate ao Além". Blanca García-Fernández Albalat diz ao respeito "É muito possível que existisse um vínculo muito forte entre Ogmios e Cúchulainn, pelo menos de tipo funcional. Cúchulainn é filho de Lug do mesmo jeito que Hércules é de Júpiter, e por outra parte, Ogmios na Gália é qualificado de Heracles”.
Voltando ao Echtra Nerai, achamos muitos aspectos dos que falamos no anteriormente. Nesta noite, Nera, leva aos defuntos á procura duma petição ao mundo dos vivos. Mas só podem aceder à terceira casa, o último passo do sol, o da decadência do astro mas também pode ter a ver com as mágicas atribuições deste número. O paralelismo do morto é o mesmo dos disfarces, de pintar-se a cara com chamiços no Magusto e pedir comida pelas casas, é o facto de dar uma oferenda as Ânimas a cambio da tranquilidade (a parte pelo todo). Infelizmente, na historia de Nera, o enforcado não ficou contente pois considerou que a agua que lhe deram de beber não era viável. Depois Nera tem uma visão e acesa ao mundo do Sidh, onde supostamente estaria a sua gente decapitada. Para entrar, acede por uma cova, uma forma de aceso ao mundo dos mouros como conta a lenda da "cova da coruja", o sidh galego. Já dentro, Nerai é aceitado ainda que tem a obriga a levar lenha. O guerreiro inclusivamente chega a casar lá. Já sabemos que os galegos que casam com a moura ficarão com ela no grandioso mundo dos mouros. Volta de novo a Ráth Cruachna, com um tempo que não se corresponde com o passado no sidh, alteração que também se produz na mourindade. Finalmente a sua gente acesa a este mundo, vence, e leva três tesouros. A procura dos tesouros são é constante da mitologia galega, sempre ao redor das mâmoas e dos castros, e no contato com os mouros.
Acho de interesse fazer de novo uma reflexão com respeito à etimologia do Magusto. Como apontei anteriormente sobre o Sámanos e o Magusto, Mag é um termo que faz referencia a achandar ou chaira. A chaira é para os povos celtas uma alegoria do mar, o qual representa ao Além. É por isso que as Óenach de Irlanda ou as Oinakoi da antiga Kalláikia se faziam em lugares de chãos. Mas essas chairas estavam num lugar elevado e fronteiriço. Precisamente essa relação existe na mitologia irlandesa com a designação do Além como Mag Réin, a chaira do mar. Se o Magusto se faz em outeiros, lugares fronteiriços e visíveis desde vários pontos duma ou varias paróquias, isto leva-nos a este carácter sacro de chaira e altura como comunicação com o Além. Pois bem, se a característica do Magusto é a sua realização nestes encraves, poderíamos estar a falar da raiz Mag como chaira com estas conotações?. Temos também o elemento do fogo: Ustus, enceso pelos druidas na óenach de Tara. Mas também não podemos excluir a hipótese de que estejamos ante um termo que provenha duma etimologia cruzada com umas características que definem o festejo: Mag (celta) como chaira; Mago (latino) como druida e depois o elemento do fogo.
Estamos a falar portanto de que na antiga Eire e na antiga Kalláikia não só existiram os mesmos festejos mas também uma mesma base mítica com semelhante simbologia. Bândua é um guerreiro, um deus relacionado com as fratrias galaicas, mas também com o deus Oghmios. Essa relação também existe em Nerai, um valente guerreiro que é capaz de viajar entre o mundo dos vivos e o mundo dos espíritos, do Sidh. Finalmente, diz a história, Nera ficará no Sidh até a fim dos tempos.
Mas todo isto do que falamos não ficou no passado. Há evidências as que apontam a que São Trocado ou Torquato, santo ao que se lhe rende culto num monte duma paróquia de Bande, posse ser a forma cristianizada de Bândua. As relíquias deste santo, acham-se, supostamente em Santa Comba de Bande.
Nesta mesma igreja, existia um ara consagrada a este deus, hoje desaparecida. Temos de observar que no irlandês antigo, “torc” equivale a javali. Na Península Ibérica achamos o epígrafe TVRCAVDI, quer dizer "rico em javalis". Portanto, a nomenclatura deste santo pode-nos remeter novamente à relação entre o javali, o guerreiro e a fortaleza, presentes em Nera e em Bândua. Mas Torquato, tem a ver com "portador de torques".
Outro aspecto do deus, é a relação com o carácter militar do torques, traçando uma relação portador-divindade guerreira. Esse vínculo está testemunhado em alguns epígrafes, entre os quais está o de Fornos de Algrodes (Beira alta, Portugal) que diz "tatideaicus" (pai dos condecorados) .
Nesta mesma igreja, existia um ara consagrada a este deus, hoje desaparecida. Temos de observar que no irlandês antigo, “torc” equivale a javali. Na Península Ibérica achamos o epígrafe TVRCAVDI, quer dizer "rico em javalis". Portanto, a nomenclatura deste santo pode-nos remeter novamente à relação entre o javali, o guerreiro e a fortaleza, presentes em Nera e em Bândua. Mas Torquato, tem a ver com "portador de torques".
Outro aspecto do deus, é a relação com o carácter militar do torques, traçando uma relação portador-divindade guerreira. Esse vínculo está testemunhado em alguns epígrafes, entre os quais está o de Fornos de Algrodes (Beira alta, Portugal) que diz "tatideaicus" (pai dos condecorados) .
No que diz respeito de Oghmios e a condução de Ânimas ao Além não podemos finalizar este artigo sem falar de certas aparições nocturnas: A estântiga, companha, estadeia, hoste etc.
Na mitologia galega do S XX-XXI ainda temos presente o carácter deste deus. A companha aparece como uma comitiva de espíritos que nos pode levar com ela no seu vagar eterno. Em algumas ocasiões, a comitiva aparece guiada por um fantasma alto chamado " A Estadeia". Este fantasma é provavelmente a herdeira de Oghmios-Bândua, deus psycopompo.
Outra evidencia temo-la ao redor da crença de que a hoste pode ir dirigida por Bode .A hoste é um exército de almas, uma das aparições da Nossa Terra, tal como se iriam os espíritos das antigas fratrias galaicas. No caso de Bode acho que se pode tratar do nosso Bândua. Há que lembrar o carácter de ligação *bhend e de liderado de fratrias. Os autores do magnífico "Dicionário dos seres míticos galegos" associam a Bode com Odin; Wode ou Wotan. A similitude entre Bândua e Odin é evidente e mais quando os celtas e germanos são povos próximos, mas acho que há que ter em conta a hipótese de que Bode seja em realidade Bândua. Em algumas ocasiões estas comitivas aparecem nos lindeiros paroquiais, nos velhos territórios sacros celtas. No seu percorrido aparecem nas encruzilhadas, como os "lares viales". Não há muita dúvida com respeito a que estas aparições semelhantes ao “ankou” bretão ou a Sluagh escocesa são a lembrança dos guerreiros conduzidos por Oghmios ou Bândua que agora saem na sua eterna marcha ao cair a noite. Mas isso, caros amigos, já é outra historia.
3 comentários:
Desde Cataluña con corazón celta y diccionario en mano...gracias!!
Un gran traballo e ben documentado, David. Hai información que publicas que me fan reflexionar sobre experiencias propias.
Rosa; gracias a ti por seguirnos desde Catalunya.Recibe un cordial saludo desde Lugo.
Carlos; Obrigado novamente.Tenho pendente afondar máis na origem da Companha,Exércitos da noite e outras apariçoes.Penso que nos podemos remontar até alguns petroglifos da Idade do Bronce seguindo a genese do fenómeno.
Um abraço¡
Enviar um comentário