sexta-feira, 8 de julho de 2011

Tipical Spanish e outras lindezas


Por José Manuel Barbosa.

Dentro de uns dias vai fazer um ano da proibição das touradas em Catalunha. As votações foram um exemplo democrático para essa histórica mentalidade hispânica intolerante com todo o que não seja “cañí” e que na maioria dos casos cria leis "ad hoc" para proibir aquilo que não partilha ou não percebe. Nesta altura só cabe parabenizar mais uma vez a Catalunha e lembrar que vai ser o 1 de janeiro de 2012 quando entre em vigor a proibição.

Os argumentos que se trabalharam naquela altura, como ainda se poderiam tratar agora foram fundamentalmente dous: o argumento humanitário e o argumento identitário. Do primeiro há pouco a dizer, porque todo o mundo sabe o que uma morte cruel com fins lúdicos supõe numa sociedade que se diz europeia e civilizada. Da segunda é comentar que bem sabemos o valor dos elementos identitários nos povos, mesmo aqueles elementos de crueldade como é neste. Na Espanha faz-se prioritária a identificação nacional sobre o humanitário e inclusivamente os inteletuais que noutros casos defenderiam a vida dum animal indefenso, neste caso defendem o simbolismo da tortura e a humilhação dum touro porque isso é sentido como muito espanhol.

Esse sentimento inclusivista  do nacionalismo espanhol de signo centralista e castelhano age procurando vínculos com aqueles outros povos ou nações que ainda dentro da Espanha lutam ou lutamos por outra identificação nacionalitária. É o caso de argumentar a origem mediterrânea da tauromaquia para defender o facto de ser tão catalã como espanhola com o fim de que a Catalunha não apresente traças nacionais diferentes do resto da Espanha. Suponho que quando se der o debate na Galiza, povo atlântico vinculado ao mundo céltico, não poderão defender essa mediterraneidade. Ou é que quiçá recorram à mentira como quando dizem que a cultura castreja tem a ver com o “Mare Nostrum” (para nós “Mare Suum”)?.

Lembro quando há um ano por estas datas havia debates em todas as TVs públicas e privadas sobre o assunto. Essa luta identitária de Catalunha versus Espanha era muito mais importante do que a problemática gerada pela crise económica que de forma natural nos faria estar pouco atentos a essa “fiesta” à qual se lhe põe o alcunho de “nacional” no Centro e no Sul peninsular incluindo-nos àqueles que nem somos mediterrâneos nem sentimos como tradicional esse tipo de atividade pseudo-desportiva .

Ainda nunca vi em qualquer meio de comunicação que se defendam com tanto ânimo e tanta força as chegas de bois da Baixa Lima as quais foram proibidas “pela sua crueldade” por um Poder Político galego que imediatamente trouxe “plazas” portáteis para passar-nos pelos narizes a prepotência suicida do seu complexado nacionalismo espanhol no que todos devemos estar incluídos queiramos ou não.

Se nos apurarmos mais, podemos falar também de elementos tradicionais que nos eliminam como é o caso do “modus operandi” na matança do porco. O galego matava por necessidade, para comer e duma forma determinada para poder sangrar o animal de jeito que a sua carne tivesse o sabor e a sanidade adequadas, o sangue fosse aproveitado para a cozinha e pudesse estar limpo e livre de toxinas, já que o seu movimento no momento em que se levava a cabo o corte na jugular favorecia a sua limpeza. Com a forma tradicional o sangue corria e era recolhido num caldeiro preparado para o caso sem ficar parado no corpo. No caso da matança ao modo agora obrigatório, o sangue parado nas veias e artérias absorve quantidade de elementos tóxicos hormonais provocados pela sua morte sem sangrado.

Eu não sei se é mais ou menos humanitária uma forma do que outra, mas se isso é o importante para a administração, porque não é que matam os touros com uma pistola no mesmo momento em que entra no “ruedo”? Será que o morbo e a crueldade que necessita o que vai a este tipo de espetáculos não estaria garantido? Quiçá o que quer o público espanhol é ver sofrer um animal indefenso, acosado e cheio de medo?

Outro elemento identitário galego que estão a destruir sem qualquer pudor  é a tradição do cozimento do polvo. Até agora fazia-se num caldeiro de cobre, mas uma legislação europeia que a Espanha não discutiu nem discute -como discute a legislação sobre o maltrato animal referida aos touros-, faz que o caldeiro seja agora doutro metal diferente “por razões de salubridade”. Depois de milénios cozendo o polvo em cobre vão-nos ensinar agora como é mais são e como é que o polvo tem mais sabor. Acrescentamos a isto, o tradicional prato de madeira, sei-que também “insalubre”, que vai deixar de ser legal para deixar passagem ao prato de plástico à venda nos hipermercados. Não se fala da falta de sensibilidade ecológica e ambientalista do novo material em relação à madeira pois o que realmente importa é o benefício que o fabricante de pratos de plástico vá ter.

Continuando com os touros, dizer que os filotaurinos arguiam em favor da sua “fiesta” que há um sector empresarial comprometido com ela, mas parece ser que não se lembra ninguém, nem galegos nem forasteiros, que aqui havia um sector ganadeiro tradicional e importante, que levava milénios em uso e também de grande futuro se o Estado Espanhol tivesse vontade de nos administrar e os votantes tivessem mais do que dous neurónios a trabalhar, que acabou quase totalmente eliminado por umas quotas lácteas impossíveis de suster pelos ganadeiros; também havia um sector pesqueiro que fazia da Espanha a terceira potência mundial em matéria de pesca e que foi também quase eliminado; há também na Galiza outros sectores empresariais pouco desenvolvidos, mal desenvolvidos ou sem desenvolver como a madeira ou o energético que não são atendidos ou são secundários para os interesses do Estado e parece que também para o próprio administrado que vota com ínfima seriedade. Vem-me também à cabeça o sector cultural e nomeadamente a língua que poderia ser um importante dinamizador da economia galega e tudo faz ver que não só o esquecem, mas que desejam que não se desenvolva para que não concorra com o seu castelhano. Como se fossem incompatíveis.

A minha ideia, proposta, portanto, é que reconvertam o sector taurino por ser economicamente de pouca importância para Espanha (ainda que lhes seja importante identitariamente). Para os galegos era muito mais importante economicamente o sector lácteo, o sector pesqueiro, o sector naval, o sector agrícola, o sector linguístico-cultural, o sector energético, e foram eliminados ou são obviados sem qualquer pudor por parte dos políticos com a conivência dos votantes absurdos e ignorantes; dos suicidas da Nossa Terra. Deixem livres os touros de lídia em parques naturais ou nacionais da geografia castelhano-andaluza e que o turismo se aproveite disso organizando safaris guiados por pessoal treinado para mostrar o “tipical spanish”. Que vivam, cresçam se reproduzam e morram em liberdade esses lindos espécimes de bovídeos ibéricos que diz que existem só para que o espanhol do comum desfrute ao ver como lhe metem um espeto pelas costas, ou no pior dos casos como um complexado macho humano recebe uma cornada de morte ali onde lhe doe só por reafirmar e demonstrar a sua virilidade com falso valor e com umas calças de talha muito menor das que usaria para andar pela rua com o fim de fazer ostensíveis aqueles signos de masculinidade que não se veriam doutro jeito.

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