domingo, 27 de fevereiro de 2022

Por que considerarmos Santa Comba dentro do Roteiro pela Gallaecia Sueva?

 


Se consultarmos a informação que podemos consultar na rede, nos livros ou mesmo se ouvimos a muitos professores das Universidades, vão dizer-nos que a Capela de Santa Comba esta incluída dentro dos monumentos identificados como visigodos. Isso que vos comento tem fácil comprovação. O que não tem tão fácil comprovação é a lógica que vou exprimir agora como prova de que a capela poderia ser anterior à época em que desde Toledo se irradiava cultura, arte e ideologia.

Inicialmente, teremos que dizer, que no Mosteiro de Cela Nova há um documento datado em 872 pelo qual o rei Afonso III encomenda ao seu irmão Odoário a reconstrução duma velha capela em ruínas, que segundo o documento, já levava mais de duzentos anos nesse estado. O primo de Odoário, e portanto, também primo do rei, de nome Odónio, levou a cabo o arranjo e restauração do pequeno edifício fazendo dele um mosteiro do qual podemos visualizar a sua conformação ainda hoje. Mas se vos conto isto, não nos explica muito o por quê poderíamos considerar de época sueva, sem muito erro, a linda capela que é uma imagem muito recorrida do pré-romântico peninsular que aparece nos livros de texto da maior parte dos estudantes de História ou de História da Arte na Europa. A cousa é que se repararmos em que em 872 já estava em ruínas e levava mais de duzentos anos como restos de uma capela, teremos que deduzir que em, aproximadamente 672 (desculpas pela exatidão nas datas que não hão de ser totalmente certas) já não havia ali um edifício novo.

Tendo em conta que na Galiza existem varias referencias reconhecidamente suevas nas suas origens, como São Pedro de Rochas ou Santa Cristina de Ribas de Sil, construidas no século V, em época do rei Miro, isto é, por volta da década de 70's do século VI, podemos inferir que Santa Comba, levando em 872 duzentos anos em ruínas, bem poderia datar de, como mínimo, uns cem anos antes da sua situação ruinosa, ou incluso mais. Se computamos esses cem anos menos em que um edifício de pedra, dificilmente poderia estar numa situação tão deplorável, as nossas contas levar-nos-iam para essa época martiniana em que localizamos os edifícios de estética sueva.

Arco de Santa Cristina de Ribas de Sil

Sabemos do impulsionamento de Martinho de Dúmio ao monaquismo em determinadas regiões da Galiza, e sabemos, também, que o catolicismo foi assumido pelos visigodos a partir de 589, durante o Terceiro Concilio de Toledo, três anos depois da anexação da Gallaecia por Leovigildo. Sabemos também que em Concílios posteriores, a herança de Martinho de Dúmio será assumida pelos reis de Toledo e pelo que nos parece, também toda a estética religiosa que vai passar a historia como falsamente originaria do cristianismo visigodo. Como prova, teremos a reprodução do arco de ferradura, na Galiza existente, já, em época romana e presente em edifícios emblematicamente galaicos e mesmo anteriores aos visigodos, como São João de Panjão (Nigrão), São Pedro de Rochas, São Pedro de Balsemão ou Santa Eulália de Bóveda. Nessa linha estética estão também São Gês de Francelos (Riba d'Ávia), São Frutuoso de Montélios (Braga)… e como não… Santa Comba de Bande, que ainda que localizada nos radares do paradigma dominantes dentro do século VII, muito parece indicar que tem as suas origens em épocas em que o panónio-bizantino Martinho de Dúmio marcava as linhas de pensamento, as linhas estéticas e mesmo as linhas geoestratégicas daquela Gallaecia anterior a Leovigildo.

Restos da Capela de São João de Panjão (Nigrão)

Conhecemos, segundo nos tem dito o nosso professor Anselmo Lopez Carreira, tanto nos seus livros, como em vivo, o facto de ser assumida esta estética sueva pelas hierarquias visigodas, que tinham este modelo de referência, junto com o bizantino, proveniente dos mais antigos edifícios cristãos católicos da Gallaecia. Com a queda do Reino Visigodo e a chegada dos muçulmanos à Península, parecem ser assumidos certos elementos pelos andalusis, como o arco de ferradura, embora mais fechado, que aparece nas mesquitas. Esse arco mais fechado, proveniente de Al-Andalus, é o que incluem dentro da arte de repovoação, não sei se bem denominado de moçarábico, que podemos distinguir em São Miguel de Cela Nova, São Martinho de Paçó de Alhariz. Isto pareceria indicar que este arco de ferradura, partindo da Gallaecia e chegando à Espanha visigoda, foi herdado pelos andalusis e dai veio de volta para a Gallaecia.

Arcos de Ferradura da Mesquita de Córdova. Compare-se com os arcos de São Frutuoso de Braga, por exemplo.

 




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