Por José Manuel Barbosa
4. O Equinócio de
Primavera
Segundo a mitologia
celta, o Ostara é o seguinte passo dos oito no que se representa a
energia em constante mudança da natureza. É a festa do começo da
primavera.
A Quaresma é a etapa
prévia e “interim” entre o Carnaval e a Páscoa. Esta última o
ponto de inflexão no que a natureza dá flor e fruto. Em total são
sete semanas de sete dias cada uma menos a primeira que tem cinco,
pois os dous primeiros dias da primeira semana são a segunda-feira e
a terça-feira de Entrudo. Estas sete semanas são, segundo a
tradição galega sete irmãs cujos nomes são: Ana, Rabana, Rebeca,
Susana.....ainda que aqui a informação que recolhemos nos leva a
dous nomes masculinos na quinta e sexta "irmã"...Lázaro e Ramos... A última irmã é a
Páscoa. O cristianismo fez o seu trabalho...
De entre essas irmãs,
a primeira é coxa. Essa eiva faz-nos
lembrar a lenda da Ana Manana da mitologia ourensana (4). A quarta e
a quinta representam dous nomes masculinos embora sejam “irmãs”.
Talvez a figura de Lázaro (amigo de Jesus de Nazaré...) nos possa
dar uma pista pensando que ele tinha duas irmãs: Marta e Maria. Esta
última é a Maria de Betânia que segundo alguns textos apócrifos
se corresponde com a Maria de Magdala, ou a Madalena.... A figura das
sete irmãs é uma constante mitológica europeia e nomeadamente
céltica que as identifica com as Plêiadas mas também com as lendas
galegas da galinha com os sete pintinhos.
Essa quinta semana após
o Entrudo e duas antes do domingo de ressurreição, a do São Lázaro
é uma festa grande em Ourense. O ritual tradicional leva à queima
dos “madamitos”, duas figuras de cartão ou papel atados a uma
roda igualmente combustível que representa a roda da vida com o
ritmo acelerado das estações. Representam a renovação da natureza
e a entrada da primavera. Não é casual que o 25 de Março seja o
dia da anunciação, dia no que o arcanjo Gabriel diz a Maria, mãe
de Jesus, que ela vai ficar grávida do Espírito Santo. É o anuncio
do nascimento de Jesus nove meses antes de este acontecer o 25 de Dezembro.
A Semana Santa é a
parte final do Ostara no que o objetivo é a renovação da natureza.
A morte e a ressurreição.
Quando chegou o
cristianismo a Europa, este adoptou as datas do Ostara como o nome de
Páscoa nos países católicos relacionando igualmente essa tradição
regeneradora da natureza com a figura de Jesus de Nazaré. Conta-nos
André Pena (Pena Granha: 1991) que os nossos antepassados celtas
acreditavam no mito de Esus, deus com caraterísticas solares que com
o seu machado cortou o madeiro da Árvore da Vida (o Hy-Brasil ou
Yggdrasyl) no que sofreria o seu próprio tormento voluntário e
posterior morte, sendo alanceado no coração com o fim de fazer
prosperar a terra e fazer com que a vida florescesse ao ressuscitar e
se proclamar rei, retornando ao mundo dos vivos proveniente do Além
como vencedor da morte.
Não há que fazer
muito esforço para reconhecer nessa lenda céltica ao Jesus cristão,
numa morte igualmente voluntária em forma e fundo e um renascer se
calhar com mais força da figura solar em questão.
O começo do verão
para os celtas é o 1 de maio, data do Beltane ou Beltaine (o bom
lume). Nesta data é quando a estação muda para dar passo ao tempo
do calor, da luz, das atividades exteriores. Quando os nossos
antepassados celebravam a presença do fruto da terra, da limpeza e
da purificação da mesma com fogueiras nos outeiros. Para os celtas,
segundo alguns autores (Pena Granha 1991: 384), o lume é um agente
de limpeza (Cf. Green, M 1999, 1995:52), daí o “Ignis/Agnis dei
tollis pecata mundi” que faz do fogo um elemento dador de vida,
de saúde, purificador e regenerador.
O costume era acender
uns fachicos de lume e passeá-los durante a noite pelos campos de
cereal para purificar as colheitas e livrar-se das parasitas.
Em muitos lugares da
Europa existe a tradição da árvore de maio que consiste em chantar
uma árvore no meio da vila adornada de motivos vegetais e alimentos.
Na Galiza igualmente se adorna de flores, bolos, roscas, chouriços e
outros elementos naturais e alimentícios. Isto acontecia até há
pouco tempo em alguns lugares da região de Ourense como nas Comarcas
da Quarquérnia ou Baixa Lima e a do Tâmega ou Monte Rei-Verim.
Pendurava-se igualmente um homem de palha ao que chamavam “Maio”
e ali ficava todo o mês. Ao final queimava-se.
No filme “The mists
of Avalon” podemos comprovar como era o ritual do Beltaine. Uma
festa de fertilidade da terra e também dos humanos nos que entre os
membros da comunidade se escolhiam um rapaz e uma rapariga jovens aos
quais se lhe propiciava um encontro sexual para favorecer a
prosperidade da comunidade. Deles dependia a felicidade do povo que
por meio desse ritual mágico pedia à terra fartura para os seus.
Nas últimas décadas e após quase séculos de cristianismo, a
ritualização não era assim mas sim é que se escolhiam um rapaz ou
uma rapariga aos que se cobria de flores ou motivos vegetais.
No
entanto, podemos achar um par, rapaz e rapariga em Laça, Comarca do
Tâmega-Verim numa festividade celebrada o dia 3 de maio e a quem se
lhes dava o nome de Adão e Eva. O ritual não era propiciar,
evidentemente um encontro sexual, embora descubramos uma similitude
com a feição originária. O nascer aos sentidos, ao mundo da
fecundidade é evidente, como também o é o costume de os moços
porem giestas ou codessos nas portas das casas das raparigas com uma
intencionalidade amorosa e portanto procriadora.
Na capital da Região
ourensana existe ainda em pleno século XXI a tradição da
construção do Maio, uma figura de madeira, de forma cónica ou
piramidal coberta de musgo e carraboujos (5) que representam
igualmente o florescer da natureza e talvez memória da árvore de
maio espalhada por toda a Europa. Após concorrência entre elas
acabam sendo queimadas no ritual de lume típico destas datas. É
muito típico também cantar as Coplas dos Maios, versos satíricos e
mesmo de Maldizer que criticam a vida política local. Existe
memória, seguindo um “modus operandi” similar a épocas
Samânicas, de irem os jovens de porta em porta pedindo os “maios”
ou “maiolas” que são castanhas secas ou nozes (VVAA: 1979).
Igualmente se estas não se recebem como se aguarda, as coplas de
crítica acabam aplicando-se como em outra festividades do ano.
Corresponde-se no calendário cristão com as festas do São João, prévio Córpus Christi. Na festividade anterior ao solstício salientamos as figuras dos dragões, imagens míticas próprias da mitologia indo-europeia e céltica, que sobrevivem em algumas localidades galegas e portuguesas ligando estas datas juninas com um paganismo reconhecível. São a Coca de Ponte Areias e a Tarasca de Monção no Córpus Christi que a dia de hoje é festa local em Ourense transladada durante o século XX para este 10 de Junho proveniente do originário 16 de Agosto, dia de São Roque.
No que diz respeito do
São João, em 24 de Junho e polar do Natal, temos a festa da luz,
que traz consigo uma serie de tradições acrescentadas, como a da
recolha de determinadas plantas que baseiam a sua utilidade em favor
da saúde, da beleza e da juventude. Estas ervas são a Erva de São
João, a Calêndula, a Arruda, o Alecrim, a Malva e outras que se
deixam no exterior da casa durante a noite e que têm origens em
épocas ancestrais em que a curação das pessoas dependia dos
remédios que a natureza fornecia no seu máximo ponto de expansão e
florescimento. As plantas medicinais seriam mergulhadas em água,
seguindo a tradição, devendo se lavar a gente nessa mescla para
favorecer o equilíbrio psico-físico e ainda a fertilidade.
As fogueiras são outro
dos elementos desta época, dando-lhe ao lume mais uma vez a
importância de elemento regenerador, fornecedor de pureza, de
limpeza e de proteção contra os elementos nocivos que impedem a
prosperidade da terra e dos seres humanos. O mal afasta-se dançando
ao redor das labaredas e queimando velhos tarecos para proteger dos
maus espíritos do passado e das más artes da bruxaria. O lume faz
fugir os dragões ocultos nas entranhas da terra e a roda de São
João ao redor das fogueiras representa o rodar do Sol pelo
firmamento. De manhã quando o Sol faz a sua aparição no horizonte
também dança marcando o seu ponto máximo de presença durante as
horas do dia.
Quando a festa estão
no seu ponto mais alto, a gente salta acima do lume três vezes para
limpar-se a si próprios e também para limpar os seus animais que
sendo levados pelos seus donos purificam os seus corpos para se
livrarem de todo meigalho ou bruxedo que os possa fazer adoecer ou
impedir o seu aproveitamento pelo ser humano.
Típica também é a
queimada feita com aguardente, açúcar e pedaços de fruta, símil
das beberagens que os antigos magos de antanho elaboravam para
ritualizarem a sua magia, tão perseguida e condenada pela igreja no
transcurso da história. Como contrapartida, a própria igreja usava
também o fogo para se livrar dos malfadados bruxos em autos de fé
nos que não só ardiam pessoas mas também interessantes
conhecimentos e saber ancestral.
Estes rituais ainda conservados na
atualidade sem muita variação foram cristianizados na honra da
figura de São João, mas nunca perdendo o seu sentido de festa
solsticial. A sua ancestralidade está fora de toda dúvida e do
nosso ponto de vista não nos cabe dúvida da sua vinculação a
festividades célticas pré-cristãs.
7. O Ciclo do
Verão
É a celebrada nos começos de Agosto. Festa de Lugh,
o deus Sol. Para os antigos celtas época de festas, tempo de
trabalho agrário mas também de felicidade, começo da época da
colheita, de maturação dos produtos agrícolas, de reuniões
familiares, competições, feiras, época para legislar, para
impartir justiça e sobre tudo de bodas. Na Galiza tradicional tem
sido assim tradicionalmente.
Nas datas atuais do 25
de Julho celebra-se uma festa solar, a do São Tiago, figura cristã
que veio substituir provavelmente à imagem do Lugh galaico. São
datas que servem para honrar à terra, neste caso à Nossa Terra que
em Ourense tem a sua manifestação nas festas da Ponte. Do mesmo
jeito, o São Roque, festa histórica da cidade até o século XX, é
datada em 16 de Agosto, dia seguinte dum 15 de agosto festivo em
todas as localidades galegas no que se rende culto à terra. A velha
Cailleach céltica, a mãe, a que dá sustento, a que protege aparece
ao redor do antigo Lughnasad ou Lugunástada, a época das bodas de
Lugh celebrada em 1 de Agosto, momento de agradecer aos espíritos,
aos deuses e aos santos com oferendas e celebrações. A fartura e a
prosperidade estão presentes porque a natureza, a terra, a velha
Cailleach nos fornece dela.
Essa festa, conhecida e
atendida por alguns seguidores atuais da religião primigénia,
representa a abertura do Portal do Leão, que abre as portas da
elevação espiritual, do crescimento, do progresso, do aparecimento
de Sírio no céu do hemisfério Norte. A coerência das datas dá-nos
para descobrirmos que a festividade correspondente de Novembro, o
nosso Magusto, é a abertura do Portal do Além ou do Sidh, que
datamos em 11 de Novembro do calendário gregoriano, mas no 1 de Novembro do calendário juliano. O 11 de Novembro atual e o 1 de Novembro anterior a 1582 estão no mesmo ponto do trânsito solar
visto astronomicamente. Igualmente, podemos afirmar que o 11 de Agosto gregoriano, data em que podemos ver as chamadas lágrimas de
São Lourenço se corresponde com o velho 1 de Agosto juliano.
Tradicionalmente o Sol é denominado de Lourenço pela cultura
popular galaica o que nos leva a deduzir que há um Lugh oculto
detrás destas datas e deste nome. Evidenciamos portanto uma
cristianização duma tradição céltica, ancestral e pagã.
Não é um festival
como os anteriormente relatados, percebido como uma grande
manifestação festiva na que participam multidão de pessoas mas uma
festa a celebrar em família. O nome com a que se a conhece
ultimamente é o de Mabon embora esse nome não seja tradicional mas
um neologismo criado pelo reconstrucionismo celta de épocas
contemporâneas. É uma das festas pagãs mais antigas e comuns de
toda a humanidade que no mundo celta se celebrava na lua cheia mais
próxima ao equinócio de outono. Tem correlatos por todo o mundo e
em diversas culturas e civilizações sendo a do mundo anglo-saxônico
a que sobrevive com o nome de “Thaksgiving”.
Contava-nos há muitos
anos o velho galeguista e quarquerno (6), antigo professor nosso no
ensino secundário, o Professor Joaquim Lourenço “Xocas”, que na
Idade Média os camponeses acreditavam na existência do espírito
nos produtos agrícolas e nomeadamente nos cereais. Nestas datas após
a colheita faziam um pequeno boneco com o último feixe de trigo ou
centeio o qual teoricamente guardava o espírito do produto. Este
boneco era levado à comida onde permanecia sentado ao lado de todos
até o final da mesma, momento em que era guardado até o ano
seguinte que era quando se queimava e se fazia um novo.
Estas crenças não
eram muito queridas pela igreja, por isso não se mantiveram até a
atualidade mas na memória de quem isto escreve está a festividade
da vindima no Ourense dos anos 70 do século XX, época de festa
familiar, de comida em conjunto entre todos os que festejávamos a
recolhida da uva nos começos do outono. O vinho e a vindima foram
desde há séculos motivo de festas na velha Áuria mas provavelmente
antes de que o vinho estivesse presente nesta cidade, desde a que
escrevemos, haveria celebrações relacionadas com a colheita
correspondente e tradicional dos produtos que naquela altura eram os
comuns. Talvez a maçã que se recolhe em datas outoniças para fazer
aquela tradicional cidra que cedeu à pressão do vinho que a dia de
hoje dá personalidade às terras de Ourense...???
Cidra tradicional e ecológica galega (Texto História da cidra em Galiza) |
É esta a última
celebração da roda das estações, a festa da Colheita, da
recolhida dos frutos e da ação de graças à natureza pelos bens
fornecidos pela terra para assegurar os futuros meses de inverno.
Coincide com o começo do outono e o costume histórico de celebrar
um jantar familiar para agradecer a fartura, abençoar a casa e
arranjar aquelas cousas necessárias para se proteger no inverno. É
época de preparação para a vida no interior da morada. O frio está
próximo e o calor do fogar há de ser o lugar central ao redor do
qual se vai desenvolver a vida familiar. O Sol decai e a roda fica
preparada para começar de novo quando o ano acabe a final de
Outubro. A lua cheia que dá passagem à abertura do Portal do Além
marca o final do velho ano e o começo do ano novo. Feliz ano novo.
Sol de Outono (Luar na Lubre) |
Comentários:
(4) A lenda da Ana
Manana:
Lá em tempos remotos,
um dos muitos galegos que iam à sega de Castela, ao vir de volta
para a sua casa, achou no caminho um senhor muito bem vestido que lhe
perguntou donde era. O segador respondeu-lhe que era de Ourense.
- E diga-me, Sr., Vc sabe algo ou conhece onde está o Poço Meimão?
- Se, sim Sr; sempre que vou a Ourense para pagar a renda ou levar alguma cousa para vender passo-lhe por ali. É um poço do Rio Minho...
Então o Sr
entregou-lhe ao aldeão um queijo que tinha quatro cantos e
disse-lhe:
- O Sr quer ser rico?
- Eu como querer, quero, sim; mas que hei de fazer para consegui-lo?
- Pois, olha –disse-lhe o desconhecido-. Não tem que fazer mais do que ir ao Meimão e quando chegar lá ao lado duma pequena fonte que há entre umas penas, ao lado do caminho, grita: “Ana Manana! Ana Manana!”; e à terceira vez vai aparecer-se-lhe uma mulher muito formosa. Vc tem de lhe dar este queijo e ela é que lhe vai entregar um rico tesouro que tem lá escondido.
O labrego acariciou a
cabeça pensando. Finalmente, olhando para o Sr, perguntou-lhe:
- E não tenho de fazer mais cousa alguma?
- Tem também que guardar o segredo sem dizer a ninguém a encomenda que leva, nem sequer à sua esposa. E deve ter muito cuidado com o queijo, porque hás de o entregar inteiro; porque se não, pode trazer uma desgraça.
- Isso tudo não é muito difícil de fazer.
- Pois tome o queijo e lembre bem o que acabamos de falar.
Entregou-lhe o queijo e
ainda não o tinha apanhado o aldeão, quando o Sr que lho deu
desapareceu sem saber como.
O bom do paisano
continuou o seu caminho rumo da sua morada depois de guardar o queijo
dentro dum lenço que atou pelos quatro cantos. Pensando com alegria
na possibilidade de enriquecer-se com o que a dama poderia dar-lhe do
seu tesouro do Meimão e um bocado preocupado porque o queijo não se
estragasse ou por se pudesse achar no caminho alguém que lhe
perguntasse que era aquilo que levava tão envolto sem saber que lhe
dizer. Mas antes de se acercar ao Meimão, foi à sua casa para
dizer-lhe à sua mulher que já tinha chegado de Castela e deixar o
dinheiro que ganhou lá, na sega, pois não queria andar com ele
guardado por aqueles lugares.
Mas muitas pessoas são
muito curiosas, e a sua mulher no momento em que viu o pacote que
levava o seu marido perguntou que era o que ele trazia.
- É uma encomenda, uma cousa que tenho de entregar. Não vá ser o demo que lhe toques! –e subiu ao sobrado para guardar o dinheiro.
Mas a mulher aproveitou
aquele momento para olhar que é o que havia no lenço. Quando viu
que era um queijo, apanhou uma faca e cortou um anaco; um de aqueles
cornichos que tinha pensando que ninguém acharia em falta aquilo.
O homem baixou do
sobrado e colheu o queixo envolto no lenço sem pesar no que pôde
ter feito a sua mulher. Saiu caminho do Meimão e apurou porque já
demorava em cumprir a sua encomenda de receber o prémio do tesouro.
Ao chegar à fonte
chamou três vezes: “Ana Manana! Ana Manana! Ana Manana!”
E sentiu um calafrio
quando viu aparecer perto do si uma formosíssima mulher, coberta com
uma linda vestimenta branca que parecia uma santa saída dum altar ou
uma rainha com o rosto dum anjo.
- Porque me chamas? –Perguntou-lhe de mal humor, como se não lhe agradasse que a tivesse feito sair da sua morada oculta.
- É para lhe dar esta encomenda que um Senhor que não sei quem é me entregou para Vc. –disse o homem; e pus nas suas mãos o lenço com o queijo.
Ela abriu o lenço e ao
ver o queijo com um cornicho comido disse encolerizada:
- Que é que me trazes cá? Que fizeche? Não che disseram que não tocasses o queijo? Este era o cavalo que havia de me tirar de este encerro mas tu não cumpriche a tua encomenda como che disseram. Foche primeiro à tua morada e a tua mulher comeu uma pata. Que faço eu agora?
E, com efeito, pus o
queijo no chão e imediatamente se converteu num magnífico cavalo
branco com asas, mas sem uma pata.
- Olha! Olha! –disse-lhe com irritação-. Agora tenho que ficar aqui para sempre entre estes penedos e tu pediche o tesouro que havia de dar-che. No entanto, pelo serviço que fizeche, toma este refaixo e põe-lho à tua mulher quando esteja para parir. Não posso dar-lhe outra cousa.
E desapareceu ela e o
cavalo coxo sem que o pobre homem pudesse ver para onde se tinha ido.
O labrego desesperou-se
cavilando no mal que a sua mulher tinha feito, tanto à Senhora como
a eles mesmos. Bem merecia um bom enfado. Mas como estava na última
parte da gravidez, tentou calmar-se pois não era cousa de se expor a
um mal maior e bufando dirigiu-se para a sua morada com resignação;
mas lembrando-se do refaixo, ocorreu-se-lhe envolvê-lo numa sobreira
que por ali havia para ver como era. Ah! Pobre da sua mulher se o
tivesse vestido! Ainda não lhe tinha dado a última volta quando a
árvore e o refaixo arderam numa rápida e violenta labareda.
E desde aquela altura a
fonte do Poço Meimão, no Rio Minho de Ourense é chamado “A Fonte
de Ana Manana”.
(5) O carraboujo é o
bugalho de carvalho, grande, redondo e com picos.
(6) Quarquerno é o
nativo da Comarca da Querquérnia ou Baixa Lima
Bibliografia:
- VVAA. Dirigidos por Otero Pedrayo, Ramón: História de Galiza. III Tomos. Tomo I. Etnografia. Cultura espiritual de Vicente Risco. Akal Editor. Madrid.1979
- Henry Swinburne: Travels through Spain in the year 1775 and 1776. http://www.bibliotecavirtualdeandalucia.es/catalogo/catalogo_imagenes/imagen.cmd?path=1002937&posicion=1
http://www.bibliotecavirtualdeandalucia.es/catalogo/catalogo_imagenes/imagen.cmd?path=1002938&posicion=1 - Pena Granha, André: Narón, un Concello con historia de seu. Tomo I. Ed. Concello de Narón. Narón.1991
- González Pérez, Clodio: As festas cíclicas do ano. Museo do pobo galego. Samtiago de Compostela. 1991
- Green, Miranda: Simbol and Image in Celtic Religious Art. Edit.Routledge. London and New York. 1989
- Green, Miranda: Mitos celtas. El Pasado legendario. Akal. Madrid. 199