sábado, 28 de março de 2015

Brasil: Novamente um alvo geoestratégico




 Por Artur Alonso Novelhe

A velha guerra encoberta entre Emergentes e Império Ocidental, agora – como já tínhamos comentado – se tornou nova guerra aberta. O Brasil joga em esse nó geoestratégico um papel de relevo na América Latina. Na tentativa de derrubar o Brasil – e com ele terminar com o sonho breve de independência econômica continental – estão depositadas parte das necessidades Imperiais anglo-saxônicas de manter o controlo hegemônico global.
Tomar o Banco do Brasil, entregá-lo a uma pequena elite de banqueiros vassalos do anel de poder londrino e de Wall Street com o fim de derrubar a Petrobras, transformá-la numa empresa menos dinâmica, privatizando-a ao serviço das grandes transnacionais petrolíferas Ocidentais; faz parte duma necessária estratégia de sobrevivência imperial, que passa inevitavelmente pela recolonização do jardim traseiro, que para os EUA foi sempre desde o século passado, a América do Sul.
A recentes manifestações em várias cidades do Brasil, nas que pudemos observar em várias das faixas reivindicativas, chamamentos ao exército para tomar o controle do país, não deixam de ser paradoxais, dado que em estes momentos é o atual governo brasileiro o único que manifestou sua disposição a garantir a soberania real do território. Os rivais mais próximos nas ultimas eleições, levavam em seus programas de governo a conversão do Banco Central, em um banco privado ao serviço do capital financeiro transnacional seguindo o modelo da Reserva Federal Americana ou do Banco Central Europeu o qual na pratica significa a entrega do fluxo monetário, sua expansão e contração, ao sector bancário privado. Este sector não conta com um anel de poder regional nem global limitando a sua ação para integrar-se no marco dos mercados mundiais geridos pelo anel de poder imperial anglo-saxão, nem tem hipótese, no curto prazo, de qualquer tipo de controlo sobre seus próprios recursos e patrimônio.
Nenhum militar entregaria a soberania do seu pais, a um poder econômico estrangeiro, pelo que podemos afirmar que se de algo pode estar preocupada a cúpula militar do país é sem dúvida, de que a situação de descontentamento brasileira, possa deteriorar-se ao extremo de o país ficar dividido em duas realidades irreconciliáveis. Esta divisão provocaria uma tensão semelhante a que hoje vive a Venezuela e não é de estranhar que todos os país da América de Sul, que estão a fazer hoje grandes esforços pela integração regional, dentro do Mercosul, Unasul ou Celac, etc, estejam sendo almejados pelos ataques econômico–financeiros, mediáticos e sociais, sendo utilizados nos protestos a corrupção como arma política muito eficaz, visando como alvo a destruição da convergência regional.

Fora da analise de modelos partidários ou da polarização esquerda–direita, o certo é que se um país tem o objetivo de ser o centro referencial dum novo poder emergente, ele precisa desenvolver um anel de poder abrangente que se consolide internamente e no âmbito regional que tenciona influenciar. Sendo no caso do Brasil, ele é o único ator com capacidade real, para impulsionar uma independência certa do continente Sul-Americano. Deve pois criar um modelo referencial exportável e compatível com o resto dos seus parceiros políticos e vizinhos continentais.

No cultural, o modelo está claro: um modelo de unidade na diversidade. Isto é relativamente fácil, num país que abrange dentro de si próprio todas as culturas, raças e tradições do planeta e que durante decênios tem colaborado na sua integração e miscigenação em contraste com o encerramento dentro dos seus próprios limites de estas próprias comunidades em outros territórios americanos.

No nível sócio–político e econômico, o Brasil precisa criar modelos flexíveis que sejam facilmente adaptáveis às realidades do seu contorno. Esse processo é secular, lento e paciente. Paciência e diplomacia têm sido duas das ferramentas que melhor sabe utilizar o poder brasileiro.

No entanto, na nova conjuntura internacional de guerra direta entre Emergentes e Anglo-saxões, é inevitável, que o Brasil ao mesmo tempo que define sua estratégia regional, resista as tentativas dos poderes exteriores de dominação.

Se por uma parte a chegada cada vez mais maciça do capital chinês tem sido importante para livrar a região duma vassalagem real ao capital transnacional ocidental, também por outra parte põe em evidência os medos do Império Norte-americano de ver-se ultrapassado como parceiro comercial e que isso signifique uma aliança Sul-americana em favor da hegemonia global chinesa. Nada mais absurdo para o futuro desenvolvimento potencial do Brasil, como trasladar o eixo do mundo do Atlântico Norte ao Pacífico... Assim que o Brasil, terá de saber movimentar-se com melhor subtilidade em este difícil contexto, exigindo de Washington novos modos de fazer política ao tempo que utiliza os amortecedores chinês e russo para evitar ser engolido pelo gigante Ocidental.

É pois em esta tessitura que Brasília precisa urgentemente criar um modelo inclusivo, a nível interno, que leve aos diferentes atores políticos do país a pactuar, precisa também um rascunho de acordo que permita pôr em marcha um anel flexível de poder propriamente brasileiro baseado na intocabilidade do Banco Central que é quem garante da independência econômica mas também precisa a manutenção das empresas estratégicas como Petrobras, garante de Independência energética, nas mãos do governo brasileiro. Terá igualmente que acordar-se um modelo econômico próprio que do nosso ponto de vista deve ser derivado do antigo modelo europeu do Estado Providência, onde o Estado faz ponte entre a força do trabalho e o capital, mantendo o equilibro entre ambos, permitindo a livre inovação, iniciativa e criatividade privada mas ao mesmo tempo desenvolvendo um modelo de redistribuição social justo e equitativo que permita às classes sociais mais humildes viver dignamente e crescer continuamente como seres humanos, com capacidade para desenvolver suas potencialidades e nobres valores. 
 

sábado, 21 de março de 2015

Carlos Peregrin Otero e o paradigma galaico da formação das línguas ibéricas




Por José Manuel Barbosa

Carlos Peregrin Otero foi um linguista e gramático galego nascido em 1930, pensamos depois de várias pesquisas que em  Vila Nova da Lourençã. Estudou em Madrid Ciências Político-económicas e Direito para posteriormente completar a sua formação na Universidade de Berkeley onde fez Linguística e Literatura Românica. A partir de 1959 trabalhou como Professor na Universidade de Califórnia em Los Ángeles para exercer de professor de linguística e literatura espanhola desde 1969 gerando uma grande revolução nos estudos relativos à língua castelhana. Grande seguidor de Noah Chomsky a quem lhe fez traduções de alguns dos seus livros. Foi autor de livros de grande peso científico de tema linguístico como "Disputaciones (lengua, cultura y política)", "Introducción a la linguística transformacional" publicado em México em 1970 e de um livro de grande interesse para nós que leva o título de "Evolución y Revolución en romance. Mínima introducción a la fonologia" publicado em 1971 em Barcelona.
Este é um estudo diacrónico da língua castelhana onde bota abaixo todos os velhos conceitos que a velha linguística manteve sobre o castelhano durante muito tempo e manifesta a sua ideia de que o castelhano é uma derivação da língua galego-portuguesa.
A censura franquista proibiu este último livro, obrigando-o a mudar parte do seu texto para adequá-lo aos paradigmas nacional-católicos dos anos da ditadura. Uma desses atos de censura foi o facto de ele afirmar que o galego é um passo anterior ao castelhano criticando que os hispanistas concluíssem com grande convencimento uma origem do castelhano independente e com vocação imperial. Segundo nos diz ele: 

"Si tuviésemos testimonios escritos de una época muy antigua, a finales del primer milenio, comprobaríamos que ambos idiomas diferían muy poco. La sintaxis actual del gallego es más arcaica, no sólo tiene propiedades del castellano de hace mil años, sino que parece plausible que estas propiedades fueran comunes. La similitud, se debe a que el gallego evoluciona más lentamente que el castellano aunque, durante siglos, da pasos similares. Es como si las lenguas románicas estuvieran canalizadas para seguir un mismo curso y que las diferencias sean de rapidez en hacerlo"

O esquema genealógico das línguas hispânicas para Peregrin Otero é um muito similar ao que um dia nós elaboramos na velha página da AGAL, lá por 2003 e que posteriormente acrescentamos e melhoramos no nosso Atlas Histórico da Galiza. Tudo, sem conhecermos a figura deste galego do qual, talvez por ser anti-franquista e relacionado com o anarquismo, não tenhamos muitas notícias.
Curioso é o facto de ser ele o que distinga duas variantes dialetais romances na península Ibérica: uma galaica no norte e outra moçarábica no sul à que lhe dá o nome de "Yudió" por serem os judeus sefarditas os que segundo ele melhor conservam os restos dessa variante linguística.

Posteriormente autores como Rodrigues Lapa no ano 1981:

 “A unidade linguística sob forma galego-portuguesa, que os mapas de Pidal demonstram para vastas regiões do centro e do sul de Espanha e os estudos recentes de Carlos Peregrin Otero acabam de confirmar, declarando que o pré-castelhano e o pré-galego foram uma e a mesma língua, a que conviria chamar romance galaico (Evolución y revolución romance, 135), seria a chave desse mistério. Já em 1929-1930 o procuramos esclarecer à luz dos elementos fornecidos por Julian Ribera e Menendez Pidal. Explica-se com isto a razão por que nos séculos XII e XIII se empregava o português como língua do lirismo. É que eles não era uma língua estranha, vivia ainda, mais ou menos alterado por influências várias nas camadas inferiores da antiga população muçulmana e moçárabe. Só assim se compreende o fenómeno realmente estranho de o vulgo castelhano o usar para a poesia lírica e satírica (...). É que havia em Espanha um lirismo que devia ser contado em português, língua falada em Castela e em outras regiões penínsulares no século XII.

 
Genealogia linguística da Península Ibérica segundo Peregrin Otero
Carvalho Calero em 1983:

 “Recorrendo à necessária abstraçom e coas cautelas e reservas que toda abstracçom implica, podemos falar em consequência dum latim gallaeco do que se derivou um proto-romanço galaico que se estendia, diversificado em distintas realizaçons do Atlântico à cordilheira Ibérica. Este pré-romanço tivo que apresentar primitivamente duas variantes: a atlântica e a mesetenha; é dizer, o fundamento do galego e o fundamento do leonês. E ambos romanços em contacto com formas idiomáticas exteriores produziram duas inflexões ou dialectos que estavam chamados a eclipsar culturalmente como consequência da sua fortuna política, às respectivas polas nas que agromaram.
Implantado sobre o substrato moçarábico lusitano, o galego deu origem ao português. Projetado sobre o adstrato eusquera, convertido às vezes em substrato pela penetração política leonesa, ou em superestrato pelas vicissitudes de repovoação, o leonês deu origem ao castelhano. Português e castelhano seriam, pois, originariamente dialetos fronteiriços do galego e do leonês, respetivamente. A Gallaecia seria um viveiro de romanços. Quando os nossos eruditos ou afeiçoados do século XIX incidiam teimosamente no erro de considerarem o castelhano como um derivado do galego, não faziam senão confundir, segundo a exposição anterior, o galego com o galaico ou galaico. Deste sim se derivaria o castelhano, mas não através do galego -galaico ocidental- senão através do leonês -galaico oriental- e Eugen Coseriu em 1989:
Genealogia das línguas da Península elaborado por nós para o trabalho "Alguns aspectos da Pré-história da Lingua"

"Poco despuesde la invasión árabe, interrumpe tambien este desarrollo, mucho antes de que las innovaciones partidas desde el centro pudiesen imponerse, tambien como norma de conservación a los centros innosvadores de Gallaecia, o la Tarraconense. De suerte que ahora puede hablarse ya del perfilarse de una unidad gallega (o quizá galaico-asturiana) sobre todo con la creación del reino de Astúrias, que muy pronto engloba a Galicia (...). Por outra parte, sin embargo, las conservaciones que oponen esta lengua (fala do galego), al castellano, al catalán o a ambos dialectos, son propias tambien del asturiano, por lo menos del asturiano occidental y -lo que otra vez, es más importante- tambíen algunas de sus innovaciones se extienden a ese mismo asturiano occidental. De acuerdo con el criterio adoptado con respecto a las lenguas que se están delineando, deveriamos, por lo tanto, decir que -como en la época anterior- se está perfilando una lengua "galaico-asturiana" con centro en Galicia; tanto más en cuanto una unidad política "Portugal" todavia no existe".

manifestam algo parecido ou igual.
Se a isto acrescentamos o manifestado pelo Professor Roger Wright em 1991:
"Antes do milénio e talvez antes do século XIII desterremos também os conceitos distópicos, pouco úteis e anacrónicos tais como galego, leonês, castelhano (...); todos esses conceitos modernos estorvam à vista clara. A península (aparte dos que falavam basco, árabe, hebreu, etc) formavam uma grande comunidade de fala complexa mas monolingue"

Igualmente já o temos manifestado em outras ocasiões que em épocas do Rei Afonso VI, morto em 1109 a língua usada pelo próprio Rei era esta na que estamos a escrever como nos conta o historiador castelhano Prudencio de Sandoval: 

".... y en la lengua que se usaba, dijo con dolor y lágrimas que quebraban el corazón:
Ay meu filho! meu filho! Alegria do meu coraçom et lume dos meus olhos, solaz da minha velhece! Ay espelho em que me soya veer, et com que tomava muy grand prazer! Ay meu herdeyro mor! Cavaleiros, hu me lo leixastes? Dade-me o meu filho, Condes!"

Por outra parte, que o Rei denominado de "Sábio", numerado como X pela historiografia castelhana mas IX segundo o nosso cômputo, escrevesse as cantigas de tema religioso mais famosas da nossa língua na Idade Média não tem nada de estranho. Era a sua língua.

Como também não é nada estranho comprovar mais personagens que aderiram a esta forma de ver a genealogia das línguas peninsulares comentando o dito pelo Marquês de Santillana no século XV  sobre uma História da Espanha escrita no Século XIII em castelhano, mas como para ele era um castelhano tão popular e tao puro, reconhecia que estava escrita numa "lengua castellana, tan cerrada que parece portuguesa".

Nada disto é partilhado pelo ensinado nas Universidades espanholas. Para elas o castelhano ou espanhol não é derivado mais do que do latim, herdeiro direto dele e língua orgulhosa falada por todos os seres inteligentes do planeta. É por isso que não faz falta conhecer mais línguas do que o espanhol. Para que?



Notas linkográficas:

(Neste web há um link que leva a um foro nazista onde se reproduzem uns mapas sobre a evolução das línguas na península ibérica. Esses mapas foram feitos pelo autor deste artigo em 2003 para a página web da AGAL (Portal Galego da Língua) e nunca foram cedidos a ninguém e muito menos a uma página dessa ideologia que traduz para o castelhano o texto e ainda não põe referências donde foram apanhadas. Os mapas originários estão aqui neste outro link:
http://www.agal-gz.org/modules.php?op=modload&name=My_eGallery&file=index&do=showpic&pid=332&orderby=titleA)
Finalmente agradecemos ao responsável pelo web "Geografias de España" Oscar Pazos a aclaração sobre a origem dos mapas.


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