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sábado, 28 de março de 2015

Brasil: Novamente um alvo geoestratégico




 Por Artur Alonso Novelhe

A velha guerra encoberta entre Emergentes e Império Ocidental, agora – como já tínhamos comentado – se tornou nova guerra aberta. O Brasil joga em esse nó geoestratégico um papel de relevo na América Latina. Na tentativa de derrubar o Brasil – e com ele terminar com o sonho breve de independência econômica continental – estão depositadas parte das necessidades Imperiais anglo-saxônicas de manter o controlo hegemônico global.
Tomar o Banco do Brasil, entregá-lo a uma pequena elite de banqueiros vassalos do anel de poder londrino e de Wall Street com o fim de derrubar a Petrobras, transformá-la numa empresa menos dinâmica, privatizando-a ao serviço das grandes transnacionais petrolíferas Ocidentais; faz parte duma necessária estratégia de sobrevivência imperial, que passa inevitavelmente pela recolonização do jardim traseiro, que para os EUA foi sempre desde o século passado, a América do Sul.
A recentes manifestações em várias cidades do Brasil, nas que pudemos observar em várias das faixas reivindicativas, chamamentos ao exército para tomar o controle do país, não deixam de ser paradoxais, dado que em estes momentos é o atual governo brasileiro o único que manifestou sua disposição a garantir a soberania real do território. Os rivais mais próximos nas ultimas eleições, levavam em seus programas de governo a conversão do Banco Central, em um banco privado ao serviço do capital financeiro transnacional seguindo o modelo da Reserva Federal Americana ou do Banco Central Europeu o qual na pratica significa a entrega do fluxo monetário, sua expansão e contração, ao sector bancário privado. Este sector não conta com um anel de poder regional nem global limitando a sua ação para integrar-se no marco dos mercados mundiais geridos pelo anel de poder imperial anglo-saxão, nem tem hipótese, no curto prazo, de qualquer tipo de controlo sobre seus próprios recursos e patrimônio.
Nenhum militar entregaria a soberania do seu pais, a um poder econômico estrangeiro, pelo que podemos afirmar que se de algo pode estar preocupada a cúpula militar do país é sem dúvida, de que a situação de descontentamento brasileira, possa deteriorar-se ao extremo de o país ficar dividido em duas realidades irreconciliáveis. Esta divisão provocaria uma tensão semelhante a que hoje vive a Venezuela e não é de estranhar que todos os país da América de Sul, que estão a fazer hoje grandes esforços pela integração regional, dentro do Mercosul, Unasul ou Celac, etc, estejam sendo almejados pelos ataques econômico–financeiros, mediáticos e sociais, sendo utilizados nos protestos a corrupção como arma política muito eficaz, visando como alvo a destruição da convergência regional.

Fora da analise de modelos partidários ou da polarização esquerda–direita, o certo é que se um país tem o objetivo de ser o centro referencial dum novo poder emergente, ele precisa desenvolver um anel de poder abrangente que se consolide internamente e no âmbito regional que tenciona influenciar. Sendo no caso do Brasil, ele é o único ator com capacidade real, para impulsionar uma independência certa do continente Sul-Americano. Deve pois criar um modelo referencial exportável e compatível com o resto dos seus parceiros políticos e vizinhos continentais.

No cultural, o modelo está claro: um modelo de unidade na diversidade. Isto é relativamente fácil, num país que abrange dentro de si próprio todas as culturas, raças e tradições do planeta e que durante decênios tem colaborado na sua integração e miscigenação em contraste com o encerramento dentro dos seus próprios limites de estas próprias comunidades em outros territórios americanos.

No nível sócio–político e econômico, o Brasil precisa criar modelos flexíveis que sejam facilmente adaptáveis às realidades do seu contorno. Esse processo é secular, lento e paciente. Paciência e diplomacia têm sido duas das ferramentas que melhor sabe utilizar o poder brasileiro.

No entanto, na nova conjuntura internacional de guerra direta entre Emergentes e Anglo-saxões, é inevitável, que o Brasil ao mesmo tempo que define sua estratégia regional, resista as tentativas dos poderes exteriores de dominação.

Se por uma parte a chegada cada vez mais maciça do capital chinês tem sido importante para livrar a região duma vassalagem real ao capital transnacional ocidental, também por outra parte põe em evidência os medos do Império Norte-americano de ver-se ultrapassado como parceiro comercial e que isso signifique uma aliança Sul-americana em favor da hegemonia global chinesa. Nada mais absurdo para o futuro desenvolvimento potencial do Brasil, como trasladar o eixo do mundo do Atlântico Norte ao Pacífico... Assim que o Brasil, terá de saber movimentar-se com melhor subtilidade em este difícil contexto, exigindo de Washington novos modos de fazer política ao tempo que utiliza os amortecedores chinês e russo para evitar ser engolido pelo gigante Ocidental.

É pois em esta tessitura que Brasília precisa urgentemente criar um modelo inclusivo, a nível interno, que leve aos diferentes atores políticos do país a pactuar, precisa também um rascunho de acordo que permita pôr em marcha um anel flexível de poder propriamente brasileiro baseado na intocabilidade do Banco Central que é quem garante da independência econômica mas também precisa a manutenção das empresas estratégicas como Petrobras, garante de Independência energética, nas mãos do governo brasileiro. Terá igualmente que acordar-se um modelo econômico próprio que do nosso ponto de vista deve ser derivado do antigo modelo europeu do Estado Providência, onde o Estado faz ponte entre a força do trabalho e o capital, mantendo o equilibro entre ambos, permitindo a livre inovação, iniciativa e criatividade privada mas ao mesmo tempo desenvolvendo um modelo de redistribuição social justo e equitativo que permita às classes sociais mais humildes viver dignamente e crescer continuamente como seres humanos, com capacidade para desenvolver suas potencialidades e nobres valores. 
 

segunda-feira, 1 de julho de 2013

O que um brasileiro deve saber sobre a Galiza e o galego






Por José Manuel Barbosa

Artigo dedicado para o amigo brasilego Paulo Soriano que leva a cabo a sua luta por dar a conhecer a Galiza aos brasileiros. Dele foi a tentativa infrutuosa de publicar este artigo num jornal do Brasil. Com muita amizade e muito agradecimento. Abraço, meu caro.

Galiza é o País dos galegos, mas a origem da palavra "galego" nada tem a ver com gente loira ou ruiva (1). Galego ou galega é a pessoa originária dum País milenar que está localizado na Península mal chamada Ibérica (2), no seu canto noroeste. Pertence politicamente à Espanha mas dir-se-ia que é o retalho que lhe falta a Portugal para chegar ao Mar Cantábrico, ou na sua zona mais ocidental, também chamado Mar Céltico.
As primeiras referências que alguém dá da Galiza são da época na que os historiadores gregos tentavam conhecer a Europa mais longínqua desde a sua perspetiva. Os nomes de Ophiusa (por ser país povoado por serpentes) (3), Oestrymnia (provavelmente por ser o País onde morriam os rios do Oeste) (4), Keltiké (pela personalidade étnica dos seus habitantes), Dragania (Terra dos dragões), ....foram nomes usados pelos cronistas clássicos, mas foi por volta do século II a.C quando no fragor das guerras lusitanas, os galegos entram na história ruidosamente. As tropas romanas chocam frontalmente na foz do Douro contra um povo que não aceita domínios imperiais. Dizem as crónicas romanas que o rio Douro passava vermelho do sangue de 60.000 soldados mortos em combate. Eram estes originários de Cale...ou Kale, hoje Vila Nova da Gaia ao Sul do Porto. Daí o céltico nome de “Kalleaikoi”, o seu gentílico, do que derivou a forma latina “Gallaeci” e daí galegos. Foi assim como a bravura duma tribo céltica da foz do Douro denominada assim, deu o nome a todos os “lusitanos” para o norte do Douro e também lhe deu o nome ao País: “Kallaikia” ou segundo a versão romana “Gallaecia”.

 O maldito romano que cometeu esse bastardo e sacrílego ato de violência era Decimus Junius Brutus, que recebeu dos seus e desde esse dia o sobrenome de “Gallaicus”, quer dizer, o Galego.
 Desde essa nefasta data da batalha do Douro de 139 a.C. até o 25 d.C em que os romanos completaram a conquista da velha Gallaecia no cerco do Monte Medúlio, passaram-se mais de século e três quartos para que os romanos pudessem dizer que esta terra era deles. Foi aí, finalmente, no Monte Medúlio onde homens, mulheres e crianças resistentes, decidiram morrer ingerindo a venenosa saiba de Teixo, uma árvore sagrada dos celtas, antes do que caírem escravos dos pervertidos romanos mediterrânicos. Ainda hoje é de difícil ubiquação esse Monte Medúlio, mas com probabilidade poderia estar nas Médulas de Carucedo, na atual comarca leonesa, embora de fala portuguesa, denominada O Berzo... ou talvez um bocado mais para o Norte, no hoje chamado Monte Cido na Comarca do Courel (5).

 A Galiza esteve quase quatro séculos dependendo de Roma. Não sem conflitos, mas finalmente com grandes achegas nos anos finais do Império. A chegada do cristianismo deu personagens como Prisciliano, a primeira vítima da repressão derivada da institucionalização da religião cristã, e de quem se diz que é realmente o sepulcro da Catedral de Compostela, não de Santiago o Maior, do qual se sabe com certeza que nunca esteve na Península Ibérica. Prisciliano, chefe duma ideia do cristianismo adaptado aos galaicos tentava sincretizar a primitiva religião galaica de raízes druídicas à nova filosofia originada na predicação de Jesus de Nazaré.
 Ainda há mais alguns personagens como a Virgem Egéria, uma mulher, provavelmente priscilianista que viajou aos Santos Lugares e que nos trouxe umas narrações conhecidas com o nome “Itinerarium Egeriae”; o historiador Paulo Orósio, contemporâneo e colaborador de Santo Agostinho de Hipona; o também historiador Hidácio Lémico bispo de Chaves (Aquae Flaviae) e furibundo inimigo dos suevos; o Imperador Teodósio e a sua mulher Aelia Flácilla, fundamentais na queda de Roma junto com os seus filhos Arcádio e Honório que passaram a governar as duas partes nas que ficou dividido o Império uma vez ocidente vê a chegada dos povos germânicos....

 A Galiza recebe com relativa tranquilidade a queda de quem a dominou quase quatrocentos anos e vê aparecer pelas suas fronteiras os Suevos, povo procedente das florestas germânicas que se estabelecem no País com uma política de “trocar a espada pelo arado” segundo as palavras do seu rei e primeiro rei da Galiza, Hermerico, com o fim de partilhar destino com os nativos. A habilidade dos dirigentes suevos que visavam a integração como fórmula para a paz e a harmonia entre galegos e suevos é eficaz e acertada. Com isto a Galiza passa-se a constituir no primeiro reino independente de Roma em 411, o primeiro em acunhar moeda, o primeiro em dar-se uma legislação com organização territorial incluída que subsiste ainda a dia de hoje no noroeste peninsular, o primeiro reino cristão e católico da Europa... Era o chamado primeiro Gallaeciense Regnum que durou desde a sua fundação em 411 até 585 em que os visigodos, instalados no centro da Hispânia anexam Galiza.
 Vão ser 126 anos em que a quase totalidade da península e parte da atual França vão estar geridos desde Toledo mas cujos reis recebiam o título de “Rex Gallaecia, Spania et Gallia”. Só até que por volta dos começos do século VIII uma guerra dinástica e o pacto entre galegos e muçulmanos norteafricanos faz com que estes últimos entrem na Europa e ocupem o que na altura era denominado por eles de “Spanija”, “Al-Ishbam” ou “Al-Andalus”, um território que coincidia com a zona de domínio visigótico e limitada pelo norte com o Mondego, o Douro e o Ebro aproximadamente. Ao norte do Mondero e do Douro ficava a velha Galiza, numa situação de vazio de poder e dividida em múltiplos poderes locais mas também os vascões e os francos que marcavam a sua presença. Ao Sul, o Islão, representado pelo poder cordovês.

 A Galiza ficou longe do poder andalusi e numa situação de desgoverno sem poder unificado mas é desde um território da atual Astúrias, onde os pequenos régulos das Primórias organizaram e emprenderam a campanha de unificar o País novamente. Em poucas décadas a Galiza voltava a ser una e as marcas da região coninbriguense voltavam a ser fronteira como em época sueva entre a Galiza e o Al-Ishbam, Spanija ou Al-Andalus (6). Esta situação durou séculos, até que um rei chamado Afonso VI anexa aos muçulmanos o reino de Toledo. É aí quando a recém nascida Castela aliada do papado junto com os conflitos entre Compostela e Braga vão fazer que a territorialidade histórica da Galiza quebre definitivamente (7).
 Castela reafirmava-se como reino opositor à Galiza, e Portugal nascia quebrando assim uma unidade histórica que dificultava todo o projeto histórico galaico. Portugal apanhava um caminho em solitário e fechava a Galiza no seu canto noroeste fazendo-a pressa fácil duma Castela depredadora que contava com o apoio dos Papas de Roma à vez que ampliava o seu território e se fazia hegemónica até o ponto de se apropriareem do nome geográfico de Hispânia ou Espanha. A Galiza acaba, depois de vários séculos de conflitos e sangue, entrando na órbita de Castela que consegue finalizar o seu labor de “pacificação” nos finais do século XV, uma década antes de os castelhanos chegarem a América.

Todo este percurso histórico não teria importância para um brasileiro se não acrescentássemos que naquela Kalláikia céltica, ocupada por uma Roma agressiva, nasceu uma língua mescla da originária língua dos Kalláikoi com o latim trazido do Lácio pelos comerciantes e soldados romanos. Foi no primeiro reino da Europa livre de romanos onde se gestou e configurou com o nome dado por alguns cientístas (8) de Galaico, um romanço que segundo alguns autores tinha duas variantes: o galaico oriental ou asturo-leonês, e o galaico ocidental ou galego-português. O primeiro gerou o castelhano na sua parte mais oriental em contato com o basco mas o segundo foi a língua romance mais importante da Europa medieval do ponto de vista literário (junto com o ocitânico), usado e cultivado tanto na Galiza, como em Portugal, Leão ou a própria Castela. A ruptura do Reino da Galiza e o surgimento dum novo reino, o de Portugal, fez com que a nossa língua pudesse ter uma expressão culta no único reino que ficou livre de Castela dentro da península hispânica e pudesse ser levada a América num ato colonial, nos séculos XVI, XVII, XVIII e XIX, fazendo com que o atual Brasil a tomasse como a sua própria língua. É esta língua, galega em origem, crioulo latino-céltico nascido na velha Kalláikia céltica a língua do Brasil atual, quinta língua mais falada do mundo, com um porvir que já desejariam para si outros países com importantes doses de poder e com um futuro promissor que não têm outras línguas extensas ou poderosas politicamente. Assim, e finalmente, podemos dizer que as raízes mais fundas do Brasil estão naquele País enevoado do canto norocidental da Hespéria que resistiu Roma quase dous séculos, que uma vez dentro de Roma deu inteletuais e pensadores de importância internacional e atemporal, que criou o primeiro Reino medieval da Europa, que safou do domínio toledano trazendo e patuando com os muçulmanos e em soma, que criou a língua mais harmónica e musical do ocidente medieval. Esse País é a Galiza e essa língua é o galego, conhecido internacionalmente com o nome de Português.


Referências:

(1)    Ainda que parece ser que aqui há mais percentagem de loiros do que no resto da Península Ibérica. Talvez algo tenha a ver o facto de serem nomeados de “galegos” ou galegas” a gente loira no Brasil...
(2)    Pois não só de Iberos de origem norteafricano está formada a Península Hispânica ou Hespérica.
(3)    Ophiusa faz referência a um País onde havia serpentes mas talvez e segundo alguns historiadores, um animal totêmico próprio da região ocidental peninsular. O culto à ofiolatria está totalmente documentado na Galiza histórica desde a noite dos tempos e ainda hoje há restos.
(4)    Oestrymnia pode-se descompor em “Oest-“ (oriente, oeste) e “Ymnia” (ou Immia que significa na língua proto-celtica “rio” ou “país de rios”). Portanto, "o Pais dos rios do Oeste".
(5)    A palavra “cido” provém do CAEDERE latino que significa matar, donde CAEDO significa “exterminar”, “imolar” e CAEDE-IS significa “matança”, “carnificina”.
(6)    A região coninbriguense mudou várias vezes da Galiza para Al-Andalus. Em total dez, mas sempre gerida por um poder político moçárabe, quer dizer, de religião cristã embora fosse dependente às vezes de Córdova.
(7)    A unidade de todo o Gallaeciense Regnum ficou por vezes partida mas sempre provisoriamente já que recuperava a sua territorialidade completa graças aos aconteceres políticos da época. 
(8)   Os cientístas em questão são Carvalho Calero ou Rodrigues Lapa. Da mesma forma, Eugén Coseriu denomina a essa língua com o nome de “galaico-astur”.

quinta-feira, 2 de maio de 2013

De delinquentes linguísticos e a logopédia necessária.





Por José Manuel Barbosa

Quando a dia de hoje uma pessoa de qualquer país da Lusofonia oficial e um galego têm de se comunicarem entre sí, podem acontecer várias cousas:

a)      Que o paleofalante galego sinta que percebe e pode ser percebido pelo seu interlocutor. Neste caso, o galego reproduz a sua fala dialetal local oferecendo uma margem de distância mínima que a dia de hoje pode não ajudar a total fluidez comunicativa entre as partes. Isto, até o século XX não acontecia, justo até o século em que a Galiza contou com uma versão normativizada da sua língua e uma política linguística que promocionou sempre uma língua “ausbau” diferente da de Portugal. Este relacionamento a duas partes, galego por um lado e português por outro, é o caso habitual que acontece no dia-a-dia nas regiões da raia galego-portuguesa onde nunca houve problemas de relacionamento nem nunca se sentiram “estrangeiros” os uns a respeito dos outros. A distância viria dada porque o português está formado numa língua padrão saída dum determinado centralismo lisboeta e o galego (mal)formado tanto em castelhano como em “galego”. Este caso está em vias de extinção, como indicou a UNESCO a princípios dos século, por serem cada vez menos os paleofalantes os que sentem o português como uma continuação das suas falas e por ser mais os portugueses (e outros lusófonos) os que sentem os galegos como mais uns “españoles” de fala castelhana, nos quais não há que confiar desconhecendo a nossa identidade comum.

b)      Que o galego, duma maioria cada vez menos minoritária, fale em castelhano. Nesse caso pode acontecer que o lusófono faça esforço por se adaptar ao outro parceiro, embora há de ser difícil que este último, se adapte ao primeiro, quer por um sentir xenófobo e supremacista incutido pelo castelhanismo, quer pela educação deficiente que na Espanha se ministra em relação às línguas, forem estas de dentro como de fora do Reino. Algo assim acontece nos países anglófonos por terem a ideia de que todo o mundo tem o dever de saber inglês...No Reino, considera-se uma cousa normal que os demais têm o dever de os perceberem em castelhano embora não à inversa sob pena de ser considerado um ignorante. A maior parte das vezes, o espanhol em questão está capacitado para perceber pela pouca distância linguística que há entre a deles e a outra mas finalmente acontece que é um problema de vontade. O espanhol não quer perceber...e o galego-espanhol como subproduto deforme e acomplexado que reproduz ridiculamente os hábitos “cañís” e por um elemento de mimetismo primate copia os comportamentos mesquinhos do modelo espanholista à moda, de caráter intolerante e impositor, fornecido pelos média embora com menos força do que os originários.
 c) Que o galego, quer paleo, quer neofalante, adopte a variante RAG na sua conversa com o lusoparlante. Neste caso o resultado final vai ser que este  perceba a fala do galego como um péssimo português ou que é um espanhol que tenta fazer esforços por falar português. Nesse caso para favorecer o relacionamento acaba por tentar ele falar em castelhano. Ainda assim....o galego-RAG pode insistir na proximidade linguística galego-portuguesa o que resulta absurdo para o lusófono que percebe a fala do galego como uma trapalhada que não há por onde apanhá-la.

Estes são três dos quatro casos possíveis que se podem dar. O que ninguém fala é das circunstâncias que levam a estas irregularidades intercomunicativas, tendo em conta que nem os políticos nem os linguistas que fazem parte das administrações galegas ignoram que as falas galegas e luso-brasileiras fazem parte do mesmo diassistema linguístico... e quando digo que eles “sabem” isso, não estou a dizer que “acreditem” ou que “tenham uma ligeira intuição”. Digo simples e diretamente “sabem” com tudo o que isso implica e compromete.
A pesar de tudo, a princípios dos anos 80 e por decisão política, os responsáveis da administração optavam por oferecer ao administrado galego uma versão normativa para a sua língua que facilitava (e ainda facilita no presente) a distância e favorece o mais alto grau de incomunicação entre galegos e o resto dos lusófonos. Essa versão foi aplicada por decreto para ser aplicada em aqueles âmbitos da vida fulcrais para incutir a ideia de diferença, como é o caso do ensino à vez que faziam orelhas moucas à discrepância legítima de tal forma que nenhum professor pudesse fugir de tal despropósito, castigando a todos aqueles que no exercício da sua liberdade de cátedra optassem por querer transmitir aos alunos uma ideia de identidade linguística galego-portuguesa ou no mais duro dos casos uma versão útil da língua.
Os professores, mesmo não ensinando outra normativa diferente à imposta por um decreto nunca consensuado eram perseguidos, discriminados, desrespeitados como pessoas e sobre eles era exercido um subtil “mobbing” dificilmente demonstrável entre outras cousas porque o claustro de professores do centro de ensino apoiava a ação, quer porque a sua formação linguística não permitia aceder a registos mínimos de conhecimento, quer porque a sua má formação humana e/ou ética os fazia incapazes de frear a ação agressiva contra o acossado, quer por medo a que sobre eles caísse também a repressão. 
Uma outra forma de “mobbing” que não afetasse diretamente à administração era deixar que o protesto “anti-lusista” fosse levado a cabo pelos país das crianças que sentiam que um “lusista” não ministrava as suas aulas como era o convencional. Nestes casos a equipa diretiva ou o claustro lavavam-se as mão de cara ao afetado mas encirrava aos pais ocultamente para apagar a dissidência. Tudo isto sem informar a ninguém que os professores possuíam e possuem legalmente o direito à liberdade de cátedra e que ainda um artigo da Constituição espanhola garante na teoria a não discriminação por qualquer circunstância pessoal e social...e portanto por qualquer razão linguística o que faz que não exista legalidade que defenda uma discriminação por razões de normativa linguística a usar com qualquer língua oficial.
Alguns casos foram muito sonoros na Galiza dos 80 e dos 90, épocas muito obscuras de regressão linguística em Galiza. Lembro dous casos especiais por se saltarem todas as linhas vermelhas do silêncio, do ocultamento  e da censura. Foram protagonizados e sofridos pelos professores Mário Afonso Nozeda e Jesus Sanches Sobrado. Este último reformado ao pouco tempo de começar a trabalhar por causa dum ambiente laboral totalmente hostil  que o levou a uma situação de estress por “mobbing”.

Por outra parte, e deixando o acosso favorecido pela administração ao que sempre estivemos submetidos os defendores da língua na Galiza, temos que acrescentar que a forma em que as aulas de “galego” se dão ainda nos dias de hoje é própria duma administração que não se importa em deformar às crianças e aos adolescentes, contrariamente ao cometido último que tem o ensino, que é formar e informar (não deformar).
Existiu sempre uma ampla percentagem de professores que não consideraram como opção válida a de começar o ensino da lecto-escritura das crianças na sua língua raiz. Cousa nunca combatida pela administração galega e mesmo impulsionada desde a “Xunta”. Nenos e nenas galaico-parlantes apreenderam e apreendem a ler e a escrever em castelhano, vendo o seu idioma relegado aos usos mais coloquiais ou simplesmente deixando-o para assuntos menores. Muitos professores são mal formados linguisticamente, com índices de conhecimento da realidade socio-linguística deficientes, com prejuízos anti-galegos ou que consideram a língua do País como um elemento de menor importância na formação dos alunos. A causa provém da sua formação universitária originada nos planos de estudo que incutem esses defetos aos futuros professores. Da administração galega parte a permissividade a considerar normal atentar contra a integridade moral e psicológica de um companheiro se este mostra sinais de “lusismo patológico” ou qualquer outro desvio legítimo em qualquer país democrático, à vez que se defende hipocritamente a liberdade do professor a saltar-se toda regra pedagógica de educar a um aluno na sua língua e de negar ao aluno o seu direito de ser formado na sua língua. 
 Na Galiza, como comentava há uns dias no PGL Fernão Portas estão-se a incumprir os dous princípios básicos do ensino quando neste há duas línguas presentes (português e espanhol....ou galego e castelhano se quisermos): “misturar e não marcar fronteira” favorecendo nos alunos o atrapalhamento linguístico podendo levar à necessidade da logopédia em alguns casos que optarem por usar a língua em público. Curiosamente aqueles que optam pelo logopeda para poderem sair num meio de comunicação público são “re-educados” para poderem falar corretamente o castelhano....nunca a língua dos galegos.
É a vontade da administração fomentar a bablização nos galegos em vez da competência nas duas línguas, cometendo um grave delito, talvez não só moral, pois demonstrada a sua intencionalidade de atrapalhar à sociedade investindo grandíssimas sumas de dinheiro público em “normalizar” o galego se obtenha como resultado final a mais alta deserção da língua nos últimos trinta anos dos últimos cinco séculos. Dito de outra forma: houve mais desgaleguizados e castelhanizados desde 1980 até hoje do que entre 1480 e 1980. A perda foi de mais dum 30% desde que chegou o PP à “Xunta” autonómica. Não são os meus dados, são dados das Universidades Galegas, das Instituições (a)normalizadoras dependentes da “Xunta” e da UNESCO.
Esta sociedade leva já muitos anos seguidos sob um regime de ignomínia, abuso, desnacionalização e corrução de todo tipo que afeta a todos os aspectos da vida dos galegos, nomeadamente a parte linguística que é da que estamos a falar, e nunca ninguém denunciou perante a justiça galega, espanhola, europeia ou internacional  a situação que vivemos de genocídio cultural, económico, evidentemente linguístico...e com a emigração favorecida pelo poder, também me atrevo a dizer que genocídio étnico. Este genocídio é subtil e em parte consentido pela ignorância e a estupidez de muitos mas também pelo colaboracionismo de outros que bem mereceriam que a justiça também caísse sobre eles. Por isso os políticos no poder desde os aos 80, momento em que se constituiu a infelizmente denominada “Comunidad autónoma Gallega”, são uns delinquentes só um ponto por baixo dos grandes genocidas da história. O único que os diferencia é que estes últimos recorreram ao sangue, à guerra e ao fogo...os nossos não precisam disso porque há muitos galegos que os votam e que favorecem a bastardia moral e política de quem leva a cabo o processo.
Falávamos acima de três dos casos nos que um galego e um lusófono poderíam interagir comunicativamente. Há um quarto caso...:
  d) O galego tem consciência de falar a mesma língua do que o outro lusófono. Nesse caso a comunicação é fluída porque a inteligência desse galego faz com que a sua fala seja mais próxima, compreensível e universal sem deixar de ser galego. Em vez de usar “irmán” usa “irmão”; em vez de usar “oir” usa “ouvir”; em vez de usar “caer” usa “cair”, em vez de usar “dicir” usa “dizer” em vez de acabar certas palavras em “-ble/bles” acaba em “-vel/veis”; em vez de usar a terminação “-ción/cións” usa a “-ção/ções” comum a todo o universo galego-português que não por perdida na fala diária é menos galega. Também provavelmente recupere a sua fonética com o uso do sesseio tão legítimo como qualquer outra forma absolutamente galega e limpando um elemento fónico de origem castelhana como é o denominado “cetacismo”... Um galego reintegracionista pode andar com o seu galego pelo mundo, pelos organismos internacionais sem sair da sua fala matriz. A sua fala é reconhecida como uma das mais importantes e sucedidas da humanidade, é respeitado e dignificado por distinguir corretamente o seu galego(-português) do castelhano e não seguir o fomento da mistura ensinado nas escolas e liceus galegos...e o que é melhor de tudo é que esse galego reintegracionista nunca deixa de falar galego quando usa a versão internacional da língua. Com essa forma de apresentar as cousas saberá falar corretamente a sua língua sem castelhanizá-la e se quiser falar castelhano poderá falá-lo também sem interferências. Os logopedas não serão necessários mas sim talvez um tribunal de justiça, não sei se nacional ou internacional que julgue os mafiosos da língua por crimes contra a dignidade deste povo pelo qual nem deixaremos de lutar nem renunciaremos de pertencer a ele.


sábado, 25 de fevereiro de 2012

A Galiza e a Lusofonia


Por Carlos Jorge Mota

Aprendemos na História e na Literatura que a Língua Portuguesa é o resultado duma lenta e gradual evolução do galaico-portucalense, língua falada em terra galaica e no Condado Portucalense. Mas houve dois Condados Portucalenses, ou Condados de Portucale: o primeiro, fundado em 868 por Vimara Peres, após a Presúria de Portucale (Porto), e cujo território se situava entre Minho e Douro, incorporado depois, em 1071, no Reino da Galiza, cujo soberano era simultaneamente detentor dos Reinos de Leão e das Astúrias; e o segundo, constituído em 1095, em feudo de Afonso VI, Rei de Galiza-Leão e Castela, e oferecido ao burguinhês Henrique (de Borgonha) que recebeu também a mão de sua filha D. Teresa de Leão. Era constituído também por territórios mais a sul, abrangendo já as áreas de Viseu, de Lamego, de Coimbra e de Idanha.
Os Suevos, povos de origem germânica, chegados à Península Ibérica aquando das Invasões Bárbaras, encabeçados por Hermerico, através dum Pacto de ajuda recíproca (foedus) com os Romanos, formam, no ano de 409, o Reino da Galiza (Gallaecia) cuja capital era Bracara Augusta, a atual Braga. Entretanto, chegados os Alanos, tentam eliminar o Reino Suevo, nomeadamente em lutas na atual cidade do Porto, mas infrutiferamente. Todavia, em 585, os suevos não conseguem resistir aos Visigodos e o seu reino é anexado por estes, que tinham a sua capital em Toledo. A designação de Reino da Galiza cessa só no Séc. XIX, com a dissolução da Junta Superior, por Maria Cristina de Bourbon, entretanto formada para defesa mais eficaz das invasões dos exércitos napoleónicos.
 Com estes pressupostos, historicamente comprovados, é legítimo nos questionarmos sobre qual a língua antigamente falada no território que hoje constitui Portugal. Óbvio que teria que ser o galego – considerando a Gallaecia de então e não a Galiza atual. Consequentemente, o Português não será mais do que um derivado da língua galega.


E os galegos que língua falam? Bom, aqui a questão não é tão linear como as aparências nos sugerem, pela proximidade temporal da época franquista durante a qual, e apesar de Francisco Franco ter nascido em Ferrol, na Galiza, só se admitia a escolaridade da língua oficial espanhola – o castelhano.
Com efeito, considerando o forte fervor de nação galega que perdura desde há muitos, muitíssimos, anos, os galegos assumem-se como faladores do galego de antanho, e não do galego oficial instituído em 1979, que a capital, Madrid, foi obrigada a autorizar, ao ser incorporada na Constituição Espanhola de 1978 a autonomia de Regiões, algumas das quais com o ensinamento da sua língua nativa. Só que esse galego oficial não corresponde ao galego genuíno das gentes galegas. O argumento utilizado foi subtil … supostamente é para mais fácil aprendizagem dessa língua pelos não autóctones, daí a maioria dos termos serem acastelhanizados, logo, aculturados. A política a isso obriga e as verdadeiras razões são facilmente entendíveis.
Só que muitos galegos – e não será um número nada despiciendo -, principalmente os mais ligados às elites culturais, não aceitam passivamente essa situação e reivindicam, por meios legais que consideram legítimos, a necessária correção para a genuína origem da língua e lutam pela não permissão do seu abastardamento.
Daí, porque consideram ser uma via eficaz, terem requerido o Estatuto de Observador junto da CPLP – Comunidade de Países de Língua Portuguesa. Entretanto, adentro da própria Galiza, constituíram, em 6 de outubro de 2008, a Academia Galega de Língua Portuguesa, e, em 2011, uma Fundação da AGLP. Na cerimónia da constituição da AGLP, em Santiago de Compostela, estiveram presentes na mesa, e fizeram a respetiva intervenção alusiva ao ato, o Prof. José-Martinho Montero Santalha, como anfitrião; José Craveirinha, escritor moçambicano, que aludiu ao facto de, na sua infância em Moçambique, sendo ele filho de português continental, da zona de Abrantes, a sua mãe dizer, com frequência, que ele era um galego como o pai; o Prof. Artur Anselmo, do Instituto de Lexicologia e Lexicografia da Academia de Ciências de Lisboa; o Prof. João Malaca Casteleiro, da ACL; o Prof. Doutor Carlos Reis, da Universidade Aberta de Lisboa; o Professor Evanildo Bechara, da Academia Brasileira de Letras.
No fim da cerimónia, foi tocado e cantado o Hino Galego em cuja letra não se refere Galiza, mas sim Nação de Breogán, figura celta mitológica a quem é atribuída a afirmação da nação galega. A ele, Breogán, também se atribui a fundação da cidade transmontana de Bragança.
Em 5 de outubro de 2009, também em Santiago de Compostela, realizou-se o I Seminário de Lexicologia da AGLP, durante o qual foi assinado um Protocolo com a Universidade Aberta de Lisboa e em que intervieram figuras proeminentes da lusofonia, nomeadamente, por parte da AGLP, o seu Presidente, Prof. José-Martinho Montero Santalha, o Vice-Presidente, Prof. Isaac Alonso Estraviz, e, por parte da Universidade Aberta de Lisboa, o seu Reitor, Prof. Doutor Carlos Reis, e o Pró-Reitor, Prof. Doutor Domingos Alves Caeiro. Intervieram também o Prof. Artur Anselmo, do Instituto de Lexicologia e Lexicografia da Academia de Ciências de Lisboa, o Prof. João Malaca Casteleiro, da ACL, a Professora Maria Francisca Xavier, da Universidade Nova de Lisboa, o Prof. Álvaro Iriarte Sanromán, da Universidade do Minho, o Professor Evanildo Bechara, da Academia Brasileira de Letras, o Prof. Adriano Moreira, Vice-Presidente da ACL.
Em 25 de setembro de 2010 realizou-se o II Seminário onde foi figura destacada o Professor Carlos Amaral, Administrador da Priberam Informática SA, que falou sobre a inclusão do Léxico da Galiza nas ferramentas relativas ao uso da língua portuguesa.
Tive já pessoalmente o privilégio de fazer uma intervenção oral, em janeiro deste ano, na Inauguração duma Exposição de lindos painéis alusivos ao Cinquentenário da Fundação de Brasília, capital do Brasil, na Corunha, na Associação Cultural Alexandre Bóveda, figura heróica que pagou com a vida o seu forte galeguismo, “crime” pelo qual foi fuzilado pelas tropas insurretas de Franco.
Em junho último tive também o privilégio de, no acompanhamento dum grupo de escritores brasileiros, ser conduzido por amiguirmãos galegos a Padrón, terra de Rosalia de Castro, e a Rianxo, terra de Castelão, e sermos recebidos pelo respetivo Presidente da Câmara, por coincidência no seu primeiro dia de funções autárquicas.
Fazendo nós uma reflexão sobre as verdadeiras origens da nossa língua, constatamos que a dita pronúncia do norte de Portugal não será mais do que uma maior aproximação às suas origens, de que se destaca algumas trocas de vês por bês (e vice-versa) e a acentuação de om em vez de ão. Mas uma curiosidade ressalta nesta apreciação do om. No Brasil, terra para onde foi transportado o português (algum dele agora arcaico), perduram palavras terminadas em om em vez de ão, de que serve exemplo o termo cupom em vez de cupão (cupom fiscal), tal qual na Galiza de hoje. A letra k pronuncia-se no Brasil , exatamente como os galegos a dizem, enquanto que no resto da lusofonia se fala capa.
Esta diversidade na unidade será, porventura, a maior riqueza duma língua. E não adianta os sulistas procurarem brindar os nortenhos com as brincadeiras da pronúncia do norte, até porque lá, principalmente em Lisboa, há também as suas caraterísticas muito específicas. Serve de exemplo a pronunciação de ô em vez de ou: touro, ouro, mouro; á em vez de ai: baixa, caixa, faixa; ai em vez de ei: feira, tinteiro, madeira; em vez de é: fera, chapéu; e no grave erro gramatical de transformar palavras dissilábicas em monossilábicas: rio, tio, desafio.
Face ao que precede sobre a Galiza e o galego, não estará o título deste artigo invertido? Não seria melhor escrever A Lusofonia e a Galiza?
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