Castelo da Piconha, tirado de "Galicia Maxica" https://www.galiciamaxica.eu/galicia/castelo-da-piconha-restos/#google_vignette |
Consultando a etimologia que do topónimo Randim faz o nosso querido e saudoso Professor Higino Martins e determinando pelo observação que é um lugar fronteiriço dentro do Concelho de Calvos de Randím, na Límia, vemos que o académico da AGLP nos diz o seguinte:
Randim conterá *RANDĀ “fronteira”, mas a derivação não é clara. Talvez *RANDĒNĪ , genitivo do adjetivo * RANDĒNON “país da raia”. Não vejo a qual das raias que toca se refere.
Portanto, se o topónimo "Randim" proceder de "*RANDĒNĪ", genitivo do adjetivo céltico "*RANDĒNON", donde "*RANDA" significa "fronteira", será que quando já havia uma fronteira, ainda se falava uma língua céltica? Com certeza, o Professor Martins Estêvez não consegue localizar a qual das raias que toca se está a referir, mas acertamos a localizar, com a ajuda valiosa do nosso amigo facebookiano Galo Dourado, uma ligação que nos permite confirmar, que para o gaulês, a palavra RANDA significa “borda”, “limite”, a qual designava uma fronteira atestada em França por vários compostos dos quais o mais claro é Camminoranda "caminho que forma a fronteira", na origem dos topónimos franceses Chamarandes (Haute - Marne ) e Chamerandes (Ain, Saône-et-Loire). O famoso tipo toponímico Equoranda que significa “limite territorial”, cuja análise final é muito debatida, também faz parte desta série de compostos (ver Yvrande).
Para alguns autores, a origem céltica não está totalmente provada e ainda poderia apresentar uma feição que nos poderia fazer pensar numa origem germânica. Tal é assim, que Der Rand, em alemão atual, significa, justamente borda, margem, orla, segundo nos comenta o também amigo facebookiano e germanista Manuel Martins. Ele argumenta-nos, com muito acerto, que não seria de estranhar a coincidência das formas germânica e céltica pelas origens indo-europeias de ambas, ainda que também pudesse ser um celtismo em alemão.
Posteriormente, e dando-lhe voltas ao assunto do significado de *RANDA, lembro que há uma Ponte de Rande na Ria de Vigo, mais do que provável fronteira histórica entre a Bracarense e a Lucense, embora também, limite norte do Bispado de Tui e portanto do Território de Toronho, região pertencente a Portugal por várias vezes depois da sua independência.
Ponte de Rande sobre a Ria de Vigo |
Mas, ainda localizamos um Rante no Concelho de São Cibrão das Vinhas, a uns 10 kms de Ourense, entre esta cidade e Alhariz, fronteira, também, histórica do possível limite norte do Condado da Límia, incluído, da mesma maneira do que Toronho, no primevo Reino de Portugal durante várias vezes depois da sua independência, mantendo-se a sua disputa durante vários séculos.
O curioso é que para procurarmos um limite ou fronteira política entre Alhariz e Ourense, acho que teremos que ir aos tempos imediatamente posteriores à independência de Portugal. Lembremos, que mesmo em tempos de Dona Teresa, mãe de Afonso Henriques, o território portucalense chegava à cidade de Ourense e provavelmente incluía a sua comarca até o Sil1. A professora Mercedes Durany (1996:125-126) apresenta-nos a prova de que existe um privilégio de 1122 em que Dona Teresa tem sob o seu controle o território onde se situa a cidade de Ourense, concedendo ao bispo Diogo Velasco e à sua Igreja o reguengo e infantado do termo de Ourense, autorizando a criação dum mercado mensal e garantindo segurança e proteção para todos os que lá forem. A qualificação de burgum que aparece neste documento para referir-se à cidade, utiliza-se nesta época para designar a nova aglomeração formada ao redor do antigo núcleo populacional. Este texto de 1122 confirma a categoria de cives para todos os moradores da cidade, quer dizer, o direito de cidadania que supõe viver como homens livres, garantindo, para eles, o direito a edificar, às terras de cultivo e à sua prosperidade.
Se Dona Teresa tinha a capacidade política de legislar de tal maneira sobre o espaço físico e humano da cidade das Burgas é que o território de Portugal, prévio à independência, incluiria o Bispado de Ourense. Tomemos conta, que em 1122, já existia o Condado de Portugal que tinha sido concedido ao seu marido, Henrique de Chalon, por Afonso VI em 1095, morto em 1112 e governado pela sua mulher durante a menoridade de Afonso Henriques, o seu filho, que em 1128 assumirá o poder após a batalha de São Mamede.
Se havia uma “rande” ou “randa” a uns 10 kms de Ourense em direção Alhariz, e assim nos consta que esta vila era a capital do Condado da Límia; sabendo que este Condado limião esteve em constante disputa entre os reis galegos e os reis portugueses e podendo haver nesse marco um limite temporário entre ambos os reinos, será que realmente, haveria uma língua céltica viva durante a Idade Média no espaço territorial da Galiza e do Portugal medievais que teria a suficiente força como para pôr-lhe o nome de “fronteira” a esse local? Se existir nesta altura essa língua ancestral, teria de ser uma língua popular, evidentemente não uma língua culta, sem dúvida ágrafa e sem hesitações, em vias de extinção mas essa suposta realidade linguística, em caso de esta existir, seria ocultada pela nossa língua romance em plena expansão e crescimento.
É tudo isto uma miragem ou podemos considerar isto como algo real? Deixo para o debate.
Bibliografia
Durany, Mercedes: Ourense na Idade Media. In VVAA: Historia de Ourense. Capitulo III. Via Láctea. Crunha. 1996
1 O Condado da Límia era a denominação do território duma antiga região do Reino da Galiza, entre os séculos X ao XII que ocupava as atuais comarcas ourensanas de Cela Nova, Alhariz, Maceda, a Límia de Ginzo, a Baixa Límia, mais todo o território da ribeira do rio Lím(i)a até a sua foz em Viana do Castelo. O facto de a vila da atual Maceda ser denominada historicamente Maceda da Límia, corrobora esta afirmação, ficando o topónimo reduzido a Maceda, quando a outra Maceda -Maceda de Trives-, passou a ser denominada pelo seu nome castelhanizado de Manzaneda, fazendo desnecessária a distinção entre ambas as Macedas pelo apelido comarcal de Límia e de Trives. A capital do Condado da Límia era Alhariz, sendo esta cidade onde se criavam os reis, onde tinham sediada a sua morada familiar e onde os tabeliões do reino assinavam como sendo “de Alhariz e da Terra da Límia”. O poder político e eclesiástico acumulado desta região, foi muito importante para o reino e para a família real.