sábado, 30 de setembro de 2023

A Etimologia de Tangaranho

 

O deus Arawn

O dicionário Estraviz define Tangaranho como “Génio maléfico e supersticioso que ataca as crianças enfraquecendo-as e deformando-as”, embora também define esta palavra como “Pessoa entangaranhada”, isto é, “pessoa deforme ou que padece uma doença física”. Mas ainda há uma terceira aceção que esta referida a uma “deformidade ou ao raquitismo atribuído a ameigamento”. Existe, também a palavra Angaranho que poderia ser percebido como um efeito mágico com a finalidade de provocar reações nas pessoas e nos animais que atingem à sua saúde e bem-estar físico.

Bom, todo isto vem a conto de ter presenciado com muito interesse e gosto a intervenção da antropóloga galega da SAGA (Sociedade Antropológica Galega) Lídia Mariño no programa 763 do Quem anda ai? na TVG do passado 28 de setembro de 2023. Para mim, tem um especial interesse este tema desde que quando eu era criança fui levado pela minha mãe e a minha tia-avó Remédios à pedra do Tangaranho no São Bento de Cova de Lobo, na freguesia de Pinhor, no Concelho de Barbadães, nas aforas de Ourense. Com poucos anos tive um problema cutâneo nas costas que se solucionou graças, segundo as mulheres da minha família materna, ao poder e ação da pedra do Tangaranho situado na localidade anteriormente citada. Eu não posso garantir que a pedra fosse a responsável da minha curação, mas o que não posso negar é a fé popular a este tipo de remédios dos que sempre a religião católica renegou ou como mínimo assimilou e sincretizou.

Angaranho de Sarreaus

Também, muito perto donde eu moro, existe uma construção pétrea, esta denominada Angaranho, sem T, onde até as décadas centrais do século XX, as pessoas que ainda professam qualquer tipo de paganismo levavam ali as suas crianças para favorecerem qualquer tipo de sanação a problemas físicos ou de raquitismo que sofressem os seus filhos… Igualmente, parece que há mais tangaranhos na Galiza, como o do Monte de São Cibrão, do que nos fala o nosso querido Rafa Quintia no seu blogue À Sombra da Bouça Panda… e sem duvida há de haver mais que desconhecemos…

Ora, a existência de pedras sagradas, assim como de fontes ou outros elementos naturais destinados popularmente a dar ou ajudar na recuperação da saúde são muito comuns no nosso paganismo ancestral, vivo até hoje e pelo qual foram provocadas muitas ofensas, estragos e mesmo custo de vidas na nossa história. Não há que fazer muito esforço para lembrarmos a razão que levou a Prisciliano a ser decapitado, figura duma importância tal que ainda não imaginamos o seu lugar real na nossa conformação como nação, provavelmente como origem dos cultos jacobeus e portanto, origem do esplendor, mas também do desastre político da Galiza medieval numa sociedade europeia regida e dirigida por um Sistema sócio-político e económico baseado no cristianismo romano, do qual Compostela foi dissidente, sofrendo as consequências posteriormente. Essa importância leva-nos a procurar sobre as raízes etimológicas da palavra Tangaranho, da que vamos falar a seguir:

Do nosso humilde ponto de vista de linguista por vocação, embora não por formação, achamos que esta palavra, Tangaranho, poderia estar formada por duas realidades diferentes. Por uma parte, o TANG- poderia ter a ver com aquela outra palavra, ou talvez frase, conhecida e registada epigraficamente na Fonte do Ídolo de Braga, identificada pelo intelectual alemão do século XVI, Georg Braun, onde se identifica um reduzido texto com ortografia latina em que se nomeia uma pessoa, provavelmente procedente de Arcóbriga, Celico Fronto, que faz uma promessa, um oferecimento ou um juramento à deusa Návia por meio da expressão Togoenabiago, onde aparece Tongoe, por um lado e, Nabiago por outro. Esse Tongoe poderia ter a ver com uma forma de juramento, compromisso, promessa ou proclama que o oferente faz à deusa Návia. O TANG-, TONG- também aparece no Táin Bó Cúailnge (O roubo do boi de Cúailnge) da mitologia irlandesa, pertencente ao Ciclo do Ulster, como uma proclama que um dos protagonista da história, nomeadamente o auriga do carro de combate de Cuchulainn, de nome Lóeg, prometendo e reafirmando-se perante os deuses do seu povo, compromete-se com a ação da batalha pela defesa do Ulster guiando o carro levado pelos cavalos Liath Macha e Dub Saindglend: Tongu do dīa toingeas mo thūath (Literalmente: Juro pelos deuses pelos quais jura o meu povo) que diz o rei dos cocheiros que morre junto com o heroi. O TANG-, TONG- poderia facilmente proceder do verbo *tong-o- que significa jurar em proto-céltico e que no Old Irish é tongaid, -toing, tó (Matasović, R.: 2009) como o mesmo significado de "jurar".

 

Fonte do Ídolo de Braga

Por outra parte, temos a terminação da palavra Tangaranho, cujo segundo elemento é -aranho que, do nosso ponto de vista estaria referida a uma divindade que poderíamos identificar com o deus gales Arawn1, rei do Annwn, o inframundo, ali onde vão as almas depois de mortas e lugar que foi visitado pelo rei Artur para conseguir um caldeiro mágico que proporcionava abundante comida, mas que também pode ser o caldeiro pelo qual o deus psicopompo gaulês, Cernunnos fazia passar os mortos para reciclá-los e fazê-los retornar ao mundo dos vivos reencarnados, preparando-os de novo para a batalha. Arawn/Aranho2 também poderia ser identificado com o nosso Véstio Alonieco, o Hospedeiro do Alem (Pena Granha, A. & Érias, A.: 2006) de Lourição, também cornudo e também psicopompo, quem recebe com os braços abertos aos que devem entrar no outro mundo, aos que vão “ir à casa de Donn”, como diriam os irlandeses, quer dizer, “os que irão morrer”.

 

Véstio Alonieco,

Esse Donn irlandês, rei dos mortos, poderia ter o seu correlato no Donão (ou Donon) do nosso Monte do Facho do mesmo nome em Cangas do Morraço, também identificado com Berobreo, como nos contam Pena Granha e Alfredo Érias. Portanto, todos estes epítetos e correspondentes galeses, gauleses ou irlandeses corresponder-se-iam com o mesmo deus do Além, quer situado nas três ilhas do Atlântico irlandês: Tech Duinn ou Bull Rock, lugar exato do enterramento de Donn, situada ao lado das outras duas ilhotas nomeadas pelos irlandeses das costas de Cork como Cow (vaca) and Calf (bezerro)… curioso que é justo como se chamam as ilhotas localizadas frente a cidade da Crunha: O boi, a vaca e o bezerro (e o bezerrinho, aliás), o que nos pode dar uma pista de como se deveram chamar cada uma das três ilhas Cies antes de receberem o nome cristianizado de Ilha de Monte Agudo, Ilha do Monte do Faro e Ilha de São Martinho (Martinho, o martelo de pagãos?). 

 

Facho de Donão (ou Donon) e ao fundo as Ilhas Cies

O Aranho é um topónimo que existe em varias localidades da Galiza, uma delas em Rianjo, onde há uma fonte, a Fonte do Aranho, popularizada por Emílio Cão nos anos 70 com a sua famosa canção interpretada com harpa e voz. Supomos que essa fonte seria de agua sanadora de doenças e de tangaranhos (usando a aceção moderna), como ritual de pacto, pedido ou juramento ao deus do inframundo para poderem os oferentes continuar neste mundo e demorar a chegada ao Além, à casa de Donão, mais um bocadinho. Relacionamos, também, esta mesma figura psicopompa com o Brerobreo, fazendo o mesmo pedido “PRO SALUTE” e dedicando a ele todas as orações e sacrifícios. E será nesse Além onde seremos recebidos pelo cornudo Hospedeiro do Além, o sorridente Véstio Alonieco, com os braços abertos para podermos desfrutar do paraíso céltico, quer o situado no interior da terra, onde achamos Arawn/Aranho, quer o que está situado nas três  ilhas do interior do mar3 com os seus nomes identificados com cada um dos três membros da família bovina. Esse Além é um lugar maravilhoso onde se localiza este outro mundo, uma paragem deliciada, onde o normal é desfrutar da eterna juventude, onde as doenças e os sofrimentos não existem e onde a abundância e a felicidade ao lado dos seres queridos é um sinal da identidade do local. Os cristãos, muito carentes duma mitologia da que botar mão, concluíram que esses modelos positivos de vida após a existência terrena eram muito bons como atrativo para gentes que procediam da religião céltica no ocidente da Europa e provavelmente influenciados pelo pelagianismo e calculo que também pelo priscilianismo, apanharam esta ideia positiva do Sidh/Além que fizeram sua, identificando-a com o céu.

Mas para isso, sempre chega o tempo.

Saúde e muitos anos!

Fonte do Aranho de Emílio Cão 


 
Bibliografia:

Matasović, Ranko: Etymological Dictionary of Proto-Celtic. Brill. Leiden-Boston. 2009

Pena Granha, André & Érias Martínez, Alfredo: O ancestral Camiño de peregrinación ó Fin do Mundo: na procura do deus do Alén, Briareo / Berobreo / Breogán / Hércules / Santiago… In Anuario Brigantino n° 29. Ed. Concelho de Betanços. Betanços. 2006

 

Notas a rodapé 

1 Provavelmente com essa nasalidade final em N pronunciada próxima ao nosso NH, ao GN francês e italiano e ao Ñ castelhano...

2 Arawn é um epónimo de Gwyn ap Nudd (o Brilhante/Sagrado filho de Nudd), onde Nudd, o pai do deus em questão, é o equivalente gales do rei dos Tuatha Dé Danann irlandeses, para eles Nuada. Lembremos que os Tuatha Dé Dannan quando foram vencidos pelos Milésios fugiram para o interior da terra, justo igual do que os nossos mouros, que habitam no inframundo deste lado do mar...

3 Curioso que J.R.R. Tolkien denominasse de Annun em élfico sindarin, reproduzindo a pronuncia galesa, às terras para alem do mar, onde estaria situada a ilha solitária de Tol Eressëa, a grande ilha tragada pelo mar, também denominada Númenor e que alguns estudiosos de Tolkien identificam com a Atlântida.

terça-feira, 28 de março de 2023

As Bandeiras dos Territórios Espanhóis. País Valenciano . Capítulo 8


 

Valência: Com a conquista do Reino de Valência por parte do Jaume I el Conqueridor, o território do país fica anexado à Coroa Catalano-Aragonesa e com ele a sua simbologia vexilológica e heráldica da denominada "senyera" das quatro barras vermelhas sobre fundo amarelo. O pendao da conquista era o do rei que portava a simbologia do Casal de Aragão:


Posteriormente, durante o século XIV e durante a Guerra entre Pedro I de Galiza e Castela contra Pedro IV de Aragão, III de Barcelona, II de Valência e I de Maiorca pela posse do Reino de Múrcia, aconteceu o assedio de Valência, que resistiu valorosamente o ataque do rei castelhano. Essa resistência valeu para que o rei catalano-aragonês honrasse o Reino de Valência com o privilégio de portar sobre o estandarte a coroa real, que incorporou.

Inicialmente, a coroa era usada ao estilo heráldico, como aparece na imagem seguinte, mas posteriormente, foram acrescentados os dos dois L originadas na condição de duas vezes leal, como atributo da cidade de Valência (Leal i Leal) e o morcego (Lo rat penat), animal heráldico de toda a Coroa de Aragão, originado na adoção do animal por similitude com o dragão que tinha sido o timbre heráldico usado na coroa do Rei. A evolução do desenho fez com que a coroa fosse incluída dentro duma faixa disposta na parte esquerda do campo da mesma, próxima ao mastro, com a coroa em vertical, como demonstrar um grande numero de portulanos.


Durante a implantação do Decreto de Nova Planta em que se anula o autogoverno e as instituições  do Reino de Valência, vai começar a ser usado um vexilo branco com o a flor de lis no centro do campo, como símbolo do domínio Bourbónico mas é desseguida esquecida e recuperada a bandeira tradicional das quatro barras e a coroa, que se exibe novamente e, 1738, embora vai ficar como elemento folclórico e festivo sem qualquer tipo de oficialidade.


 

Mas vai ser nesta altura de finais do século XVIII e inícios do XIX quando a coroa é modificada e despregada adotando a forma atual determinando-se a cor azul da faixa, inicialmente, um azul claro, juntamente com o desenho da coroa despregada pela faixa, embora esse fique sendo o desenho da bandeira da cidade.


Assim foi representado o vexilo valenciano durante o século XIX, embora, vai ser durante este mesmo século, que o valencianismo político ressurgido a partir da denominada Renaixença, vai reivindicava os direitos históricos do País Valenciano assumindo esta bandeira. No entanto, nos inícios do século XX, começaremos a ver uma bandeira similar, mas não igual, conservando as barras vermelhas e amarelas mais a faixa azul, mas sem a coroa despregada. O novo acréscimo vai ser uma estrela branca que vai ser considerada a bandeira nacional valenciana uma vez que o valencianismo começa a se autodenominar nacionalista.


Mas uma nova época de proibição e repressão vai acontecer depois d
a finalização da Guerra do 36 com a vitoria do franquismo, em que foi considerada uma bandeira subversiva e separatista, a qual não podia ser exibida nas "fallas" nem em qualquer outra festividade, sob pena de um dia de prisão por cada bandeira "separatista" que fosse exposta publicamente.

Durante o final do franquismo, o valencianismo começa a utilizar a bandeira das quatro barras sem a coroa nem a faixa azul, incluindo, unicamente o escudo do País Valenciano no centro do campo do vexilo, como símbolo do pais e deixando a bandeira da coroa para a representação da cidade de Valência. Esta bandeira foi a bandeira pré-autonómica e visava ligar memória história, língua e pontes outras pontes com o nacionalismo catalão, ao mesmo tempo que tinha vontade de recuperar o nome de Pais Valenciano ou Reino de Valência. Nada disso foi concedido. Contrariamente, os elementos mais reacionários do franquismo reagiram com força interferindo na identidade linguística, na denominação do país e na feição da bandeira. 

O Estatuto de Benicassim, elaborado em 1981 incorpora esta ultima bandeira como a que deveria ser oficial no Pais Valenciano, mas depois de graves ações protagonizada pelos herdeiros do franquismo, fez-se obrigado uma negociação sobre estes elementos fulcrais na identidade valenciana e opta-se por incorporar um novo modelo de bandeira em que aparece a faixa azul, mas inicialmente, com o escudo tradicional.


As possibilidades estavam entre o valencianismo catalanista e o conservadorismo de raiz espanholista. Desde a definição de País Valencià ou Regne de Valência até o inócuo nome final de "Comunidad Valenciana". Finalmente e depois de muitos protestos e, mesmo violência, a bandeira acabou sendo a "Reial Senyera Coronada" ou "Senyera em Blau" símbolo da cidade capital do histórico reino que consegue a oficialidade em 1982, momento da aprovação do Estatuto de Autonomia. Esta bandeira é a tradicional quatribarrada com a coroa despregada pela faixa azul em vertical do lado da haste, em contraste à que representava o nacionalismo catalanista onde a quatribarrada, similar à aragonesa e à catalã autonómicas, apresentava o escudo do país no centro. A solução aplicada foi a de tentativa de vencer o catalanismo por parte do conservadorismo neo-franquista da transição, que  tambem se chegou a manifestar na vontade de secessionismo linguístico "blavero" que  determinou durante os anos 80 e 90 que o valenciano não fazia parte do complexo linguístico ibero-românico  oriental. 


Finalmente o que queremos demonstrar é a historicidade da bandeira valenciana que data de finais da Idade Media dentro do contexto simbológico catalano-aragonês. Outra cousa são as tendências políticas do momento mais próximas ou mais afastadas da reafirmação nacional valenciana e a vinculação histórica e linguística à Catalunha, muito reprimida por parte do centralismo histórico e ao recente.

 

 


domingo, 11 de setembro de 2022

As Bandeiras dos Territórios Espanhóis. Múrcia. Capítulo 7


Não conhecemos a possível representação vexilológica utilizada em época do Conde Teodomiro de Aurariola, que resistiu e pactou com os muçulmanos no século VIII e que ocupava aproximadamente a região que hoje poderíamos identificar com o histórico reino de Múrcia, mas sabemos que durante esse século, o território da Espanha foi unificado ao redor da capital cordovesa centralizando o poder andaluzi e organizando-se num emirado dependente de Damasco. Sabemos, no entanto, que a rutura de Al-Andalus foi real a partir do primeiro terço do século XI, após a fitna que levou à independência das Taifas. Nestes momentos  iniciais so conhecemos um vexilo que sobre fundo branco é cruzado por uma faixa azul celeste bordeada em verde, talvez como representação do rio Segura, que  era o que dava unidade e identidade à bacia do mesmo, quer dependente da Taifa de Valência, quer independente.


 Posteriormente, depois da anexação de Toledo por parte de Afonso VI, as Taifas andaluzis chamaram os almoravidas que unificaram Al-Andalus, mas quando se levou a cabo uma grande rebelião contra estes causada pela sua intolerância, chefiada pelo líder Saif al-Dawla, vassalo e amigo do Imperador Afonso VII, o oriente peninsular ficou conformado por uma grande Taifa dirigida por Ibne Mardanis que fez da cidade de Múrcia a sua capital. A importância e o esplendor da cidade foram imensos e referenciais para Europa e o Mediterrâneo. Morto o conhecido como rei Lobo, o reino caiu nas mãos dos almoadas. O domínio almoada durou uns cinquenta anos, até o momento em que  Ibne Hude expulsa os norte-africanos reunificando quase todo Al-Andalus tendo como capital a cidade murciana. A debilidade andaluzi do momento não vão impedir que Fernando III de Galiza e I de Castela consiga conquistar Xaém, Córdova e Sevilha. Pouco depois da sua morte, o infante Afonso de Castela, filho de Fernando III e príncipe sucessor ao trono, faz-se com a Taifa de Múrcia, fique incorporada a Castela. Dessa época sabemos que o vexilo usado é um pendão totalmente verde, em memória dos fundadores de Al-Andalus, a família dos Omíadas.


A partir de 1243 e até 1266, o Reino de Múrcia passou a fazer parte da Coroa Castelhana por conquista da Taifa andaluzi, regida por Ibne Hude al-Dawla. A conquista e ocupação foi protagonizada pelo infante Afonso de Castela, futuro Afonso IX o sábio. Posteriormente houve uma importante rebelião dos mudejares, que eram muçulmanos aos que lhe foi permitido permanecer nas regiões conquistadas pelos cristãos, que teve como consequência imediata a eliminação de todas as instituições murcianas e o translado do centro do poder de Cartagena para a cidade de Múrcia. O pendão concedido por Afonso o Sábio era o seguinte: Sobre fundo vermelho, cinco coroas em amarelo representando os cinco reinos andaluzis que o rei Afonso incorporava ao seu poder real fazendo parte da Coroa castelhana: Toledo, Xaém, Córdova, Sevilha e agora Múrcia.


Mas foi entre 1296 e 1304 que Múrcia passou a fazer parte da Coroa catalano-aragonesa quando lhe foi concedido um vexilo de estética catalã, onde sobre fundo amarelo atravessavam duas faixas vermelhas em sentido horizontal. 

A partir de 1304, o reino de Múrcia retorna a Castela que é quando achamos um vexilo conformado por um fundo vermelho com seis coroas em amarelo. O pendão prolongava-se longe da haste em cinco faixas. 


Mas foi em época de Pedro I, por volta de 1361, que este pendão de seis coroas, dispostas em duas colunas de três cada uma, aparece acrescentado com um novo elemento na bordadura, já que incorpora os escudos castelhano e leonês, alternando-se no corpo da bandeira, não incluindo nenhum elemento nas faixas. Este pendão permaneceu como símbolo do reino durante muito tempo.

 
Com a chegadados franceses, o Reino de Múrcia recuperou certo poder político e agiu organizando as suas próprias defesas contra o invasor, pelo que se formou o Batalhão Provincial de Múrcia, número 10, durante a chamada Guerra da Independência. O símbolo sob o que se reuniram os combatentes era uma bandeira azul cobalto que serviria de base para representações posteriores.
 
 
A partir da chegada ao trono de Isabel II e a divisão provincial de Javier de Burgos, o Reino de Múrcia acaba sendo abolido para se constituir uma região sem poder político autónomo, mas dividida em duas províncias: Albacete, que surgiu com os territórios nortenhos do antigo reino de Múrcia, aos que se lhe acrescentaram terras das antigas províncias da Mancha e Cuenca; mais a província de Múrcia propriamente dita, constituída com o resto dos territórios que ficavam do antigo reino e que não  tinham ficado em Albacete.
Mas é durante o século XIX, que a nova região de murciana levou a cabo várias tentativas de autonomia cantonal, manifestadas em forma de rebelião armada, com especial protagonismo das localidades de Cartagena, a cidade de Múrcia, Jumilla, Almansa, Chinchilla,...  Os revolucionários usavam uma bandeira completamente vermelha, resultado de pegar numa bandeira do Império Otomano e tingi-la totalmente de vermelho, apagando o símbolo da meia lua e da estrela. 
 
 
No entanto, o cantão de Cartagena, optou por apresentar um outro modelo apanhado da contrassenha da Marina Mercante espanhola para a província marítima de Cartagena. Esta bandeira era uma cruz branca sobre fundo vermelho, que serviu como base para a posterior bandeira autonomista murciana, utilizada durante a II Republica Espanhola.
 
 
Anteriormente, desde a criação das províncias e a aprovação das bandeiras provinciais, Múrcia passou a ver-se representada por uma bandeira azul cobalto com o escudo coroado no centro. Esta bandeira foi reconhecida como bandeira provincial e usada como insígnia da Deputação de Múrcia até a chamada Transição baseada na bandeira azul cobalto com que o Batalhão número 10 defendeu a região dos franceses. No interior do campo da bandeira, aparece o escudo representando os nove partidos judiciários em que estava dividida a província: Múrcia, Caravaca, Cartagena, Cieza, Lorca, Mula, Totana, La Union e Yecla.
 

Por sua vez, Albacete teve uma bandeira provincial desde 1956, ocupando um campo de vermelho carmesim com o escudo no centro que  reunia todos os  partidos judiciários, embora modificada a partir de 1994 por uma bandeira, também em vermelho carmesim com um novo escudo com a coroa real espanhola.
Finalmente, com a morte do ditador Francisco Franco e a implementação da denominada Espanha das autonomias, a região de Múrcia reclamou para si um estatuto de autonomia, com o qual se dotar de simbologia própria. Assim foi que se desenhou uma nova bandeira regional que se descreve da forma seguinte: Bandeira retangular em vermelho carmesim, também chamado vermelho Cartagena. No ângulo superior esquerdo aparecem quatro castelos com três ameias cada um em ouro, isto é, em amarelo, distribuídos de dous em dous. Cada castelo, representa cada uma das quatro culturas fronteiriças que determinaram a identidade do Reino de Múrcia: a castelhana, a catalano-aragonesa, a andaluzi e a quarta, que representa a influência mediterrânica. Na parte inferior direita aparecem sete coroas reais dispostas em quatro filas organizadas em três fileiras horizontais e sobrepostas, com três coroas a superior, duas a intermédia e uma a inferior, e sobre elas, a sétima coroa, concedida pelo primeiro monarca Bourbon. 
Das seis coroas históricas que permaneceram desde Pedro I, passou-se agora às sete, fruto do agradecimento de Filipe V ao povo murciano pelo apoio na Guerra de Sucessão, que trouxe os Bourbons a Coroa Hispânica no século XVIII.
A bandeira foi concebida em 1978 por uma comissão do Conselho regional criada especificamente com o objetivo de dotar a nova região autónoma de uma simbologia própria. Nessa comissão estavam os historiadores Juan Torres Fontes e José Maria Jover Zamora, autênticos autores  do vexilo.
 

A todo este repasse
à simbologia vexilológica murciana, teremos que acrescentar a bandeira do regionalismo murciano que acrescenta ao estandarte, já conhecido e oficial da região de Múrcia, a cruz branca do cantonalismo de Cartagena, com uma cruz azul no meio, que representa as aspirações soberanistas.
 
 
Poderíamos acrescentar, aliás, uma outra bandeira, a do nacionalismo murciano de esquerda definida como uma bandeira vermelha com sete estrelas, em vez de sete coroas, dispostas da mesma maneira do que as coroas da bandeira oficial.  
 

 

 


 

 

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