terça-feira, 16 de janeiro de 2024

O modelo linguístico albanês.

 


O albanês é uma língua de origem indo-europeu falada na região dos Balcãs banhada pelo Adriático, que está rodeada pelo grego, no Sul, e pelas línguas sul-eslavas no Norte (servo-croata) e Leste (búlgaro-macedónico). É a língua oficial da Republica da Albânia, mas também do Kosovo, onde também é língua nativa. O albanês é falado maioritariamente nas partes mais ocidentais da Macedónia do Norte por quase um quarto da população e onde desde 2019 está reconhecida como a segunda língua oficial de todo o país; fala-se em Montenegro, na Grecia (Epiro, Ática, Beócia, Argólida, Coríntia, Eubeia, Andros, Lócrida, Ilhas Sarónidas, Trácia, etc), onde mora o grupo étnico albanês dos arbanitas e os camérios mas também na Itália, (nos Abruzos, a Basilicata, Calábria, Campânia, Molise, Apúlia e Sicília), onde é reconhecida a minoria dos arberescos, procedentes da Grécia e emigrados para as regiões da Itália meridional graças ao apoio que os reis de Aragão-Catalunha, Afonso V de Trastâmara, Fernando II de Trastâmara e posteriormente o Imperador Carlos I deram aos albaneses na sua resistência contra os turcos otomanos quando estes conquistaram as regiões helénicas do Império Bizantino.

O albanês tem origem indo-europeu e dentro desse grupo de línguas, pertence ao grupo de línguas paleo-balcánicas ao qual pertenceram varias línguas mortas, como o dácio, o trácio, o frígio, o ilírio (do qual se supõe, tradicionalmente, deriva o albanês), mas também o arménio e o grego, línguas ainda vivas. Tem dous grandes dialetos: o gegh (ou guego, em português) e o tosk (tosco, em português) falados ao norte ou ao sul do país e divididos pelo rio Shkumbi. Mas ainda se reconhecem mais dous subdialetos de base tosca, o arberesco, pertencente aos italo-albaneses e ainda o arbanítico, falado no Epiro grego e no Peloponeso pelos arberescos que não emigraram a Itália.

Os Vilayet ou províncias otomanas antes das independências dos países balcânicos

A dominação otomana foi marcante para os albaneses, embora foi no exterior que se iniciou o cultivo literário da língua, não na própria Albânia, iniciando o seu percurso na escrita com o alfabeto cirílico, paralelamente aos usos do servo-croata e do búlgaro. Foi nesta época em que aconteceu a grande migração a Itália e Grécia e a conversão forçosa duma grande parte dos albaneses ao Islão. Isto foi duma relativa importância, marcando-os com um certo privilégio, embora como etnia submetida, dentro da administração otomana. De qualquer maneira, o albanês permanecia proscrito e como língua subalterna, sob a supremacia do turco. Neste altura, também aconteceu o povoamento e colonização do Kosovo, inicialmente eslavo. No entanto, a língua estava viva e o texto mais antigo em língua Shqipe, nome com o que se designam a si próprios os albaneses, é de 1462 e está escrito em gheg. Conserva-se a frase ritual típica para o batizado no arcebispado de Durrës, assim como uns versículos do Novo Testamento e um hino da Pascoa Ortodoxa em tosk. O livro mais antigo conservado é um missal ortodoxo (Mëshari) em gheg de 1555 e um outro texto sobre a doutrina cristã em arbanítico de 1592 (E mbesuame e krështerë). Já no século XVII, em plena batalha religiosa da Contrarreforma, é que se inicia uma etapa de crescimento literário do albanês em gheg meridional apesar da pressão otomana, em que alguns escritores albaneses de religião muçulmana começam a utilizar a ortografia árabe, como Nazim Berati ou Hasan Zyko Kamberi. Esta via de reafirmação linguística representa a primeira manifestação dum albanês culto baseado nas falas de Elbasani, mas de maneira instável, usando vários alfabetos e diversas variedades populares.

Em 1908, a intelectualidade albanesa reúne-se em Manastir, hoje Bitola, segunda cidade mais povoada da Macedónia do Norte depois da capital Escópia, para discutirem qual a ortografia mais adequada para o albanês. O percurso dos tempos tinha levado os albaneses a usarem o alfabetos cirílico, grego, latino, árabe e três variedades de alfabetos autóctones: o elbasan, o büthakukye e o argyrokastër, criados entre 1750 e 1850 como forma de reafirmação nacional e linguística. A decisão foi ordenar a língua e adotar o alfabeto latino sobre a base do gheg de Elbasari, como levava sido o tradicional até o momento, mas depois da independência em 1912, a língua albanesa colhe um importante impulso, convertendo-se em língua oficial do país.

Membros da resistência albanesa na Segunda Guerra Mundial. Na direita, o líder da resistência albanesa, Enver Hoxha

Depois da Segunda Guerra Mundial e a chegado ao poder de Enver Hoxha, favorece-se mais uma mudança no padrão albanês, propiciada pela origem tosk do novo líder dos partisans da Albânia. Ao finalizar a guerra, o novo padrão oficial vai estar baseado no dialeto do líder da Republica Popular de Albânia, apesar de ter sido o gheg a variante que tradicionalmente se tem usado para este cometido. E assim ficou até hoje.

Sobre o Kosovo, falou-nos o amigo da Galiza e linguista basco José Luís Álvarez Enparantza num Congresso organizado pela AGAL há muitos anos, la em 1987 e contou-nos o seguinte: No Kosovo, de fala gheg, existiu uma importante distância política com a Albânia durante a pós-guerra, devido à rutura entre a Jugoslávia de Tito e a Albânia de Hoxha, pelo que os kosovares optaram por uma padronização centrada no seu dialeto gheg nordestino, isolando as suas falas do resto do domínio linguístico Shqipe a partir de 1944, já que a Albânia optava pelo tosk sem a mais mínima sensibilidade pelos irmãos que ficavam fora das suas fronteiras políticas. Assim foi entre 1944 e 1968, em que cada país apanhou o seu próprio caminho, até que em 1968, num congresso levado a cabo em Pristina organizado pela intelectualidade kosovar, decidiram refletir sobre o assunto e por bem da unidade linguística, optaram pela assunção da norma tosk com vistas ao futuro e pela saúde do albanês, rechaçando o modelo atomizador servo-croata, cujo protótipo é aplicar dentro da mesma língua, quatro standards (sérvio, croata, bosniaco e montenegrino), dous alfabetos (cirílico e latino) e constantes confrontos, ódios e limpezas étnicas. Sobeja dizer, que esse modelo elaboracionista é o que assumiram as instituições oficiais galegas até agora, com a figura do Žarko Muljačić como guru das línguas Ausbau… O Kosovo, finalmente, decidiu unificar os textos para o ensino seguindo os modelos de Tirana, iniciou a implementação das gramáticas tosk e legendagem no novo modelo de padrão e iniciou as adaptações ortofónicas a todos os níveis. As vantagens foram evidentes em pouco tempo a respeito da edição, na produção áudio-visual, nos intercâmbios universitários e no progresso da língua. Todo isto ajudou com a reafirmação nacional que derivou na conquista da soberania do Kosovo e da normalização plena do albanês no país do Campo dos Melros.

O caso albanês-kosovar é um exemplo de exo-normalização sucedida que pode servir de exemplo para os galegos, como também podem ser exemplos o da Taalunie de Flandres, o modelo reintegrador da Moldávia ou o do Quebeque, em que a unidade da língua histórica esta por cima de interesses partidários, particulares e gremiais.

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