Por Artur Alonso Novelhe:
Como bem vínhamos observando, em contradição com aqueles que agoiram sempre a pronta queda do Império Ocidental, Ocidente que segue a controlar os três tabuleiros principais, onde se joga a partida pela supremacia (a saber: Militar, Econômico e Social – Cultural), comanda e toma a iniciativa, em todos os campos de jogo. Depois de um pequeno período em que parecia a China poder desafiar o gigante Norte-Americano, dentro do tabuleiro económico, de novo o comando imperial anglo-saxão, volta reconduzir a situação em seu favor...
A Rússia, que muitos acreditam possa desafiar o poder militar do Ocidente, está claramente à defensiva em este jogo, a pesar de seus esforços bem encaminhados tanto na Crimeia, como na Ucrânia ou na Síria (exercícios combinados de bom fazer militar, diplomático e político)...
Vimos advertido duma prolongada guerra encoberta entre Emergentes (com direta implicação do binómio Rússia – China) e Ocidente, que a cada dia se torna mais visível. Realmente o confronto direto é sem duvida com China – única potencia capaz de desafiar economicamente Ocidente. Mas a Rússia, ao ser a única potencia com capacidade real de defrontar Ocidente – alem de sua situação geo-estratégica e seu gigantesco tamanho, bem como suas riquezas energéticas – deve ser dominada; pois controlando Rússia, não é possível grande mobilidade ao expansionismo chinês...
A tentativa de deteriorar a economia russa através da combinação de sanções exteriores e declínio dos preços do petróleo; obrigando, paulatinamente, a um aumento do défice orçamental e do défice da balança de pagamentos...
Não tem funcionado de tudo, mas tem minorado consideravelmente as capacidades da economia russa e sua angariação de fundos de reserva.
As sanções exteriores, pela contra não tem sido muito haveis a hora de aumentar a pressão sobre a sua económica, na tentativa de obrigar a seu governo a privatizar em favor de investidores internacionais. Na Rússia atual, desenvolve-se um poder bicéfalo, onde neoliberais mais achegados ao Primeiro Ministro Medvedev e os nacionalistas mais estatistas mais achegados ao Presidente Putin, convivem em relativa harmonia. A contração da economia não tem ajudado a criar um clima favorável a privatizações, dado a baixa cotação agora dos ativos russos. O qual impede um plano que seria de interesse do ocidente, de transformar a economia russa numa economia rendista, que num prazo mais alargado – vencera as leis aprovadas por Putin, que impedem o acesso maciço do capital estrangeiro a Federação – permitindo na pratica o domínio exterior, por meio da retirada continua de lucros em benefícios de proprietários estrangeiros (com a desculpa duma maior industrialização)... Algo que de momento o governo russo tem evitado.
Mas uma tentativa de privatização, embora seja com intuito de voltar os capitais dos oligarcas russos no estrangeiro, poderia abrir essa porta, se o poder russo não manter um vigoroso tecido publico industrial, em contrapeso do privatizado...
E este jogo ainda está andamento, variante que faz possíveis acordos mais globais entre a Rússia e os EUA– que mesmo possam concluir no reverter das sanções a Moscovo.
A sua vez Ocidente tem melhorado suas posições por todo o planeta, com a criação na Ásia, de acordos de Livre Comercio que tem debilitado a posição anterior dominante da China, regredindo para uma posição de participante ativo e sócio muito importante. A criação dum banco de investimento Emergente, e alça da Bolsa de Valores de Xangai – obrigava a um movimento rápido do Ocidente, na corrida pelo poder económico global.
Na América do Sul, a tentativa brasileira de criação dum marco geográfico de interação e poder, que possibilitasse uma independência econômica do Continente – por meio de reforçar Mercosul e fundamentar Unasul – tem sido bem contrapesada, com a criação da Aliança do Pacifico, e a queda da presidência da Argentina, com laços muitos fores com Brasília; assim como a grave crise gerada na Venezuela. Brasil tem reagido com habilidade, tacto e sutilidade; mas as pressões dentro da sua própria casa – onde o sector neoliberal, aliado do Ocidente, está a aumentar seu poder, impedem grandes contra-ataques.
Uma futura Privatização do Banco Central do Brasil – com a subida ao poder de partidos de corte neoliberal, converteria sua economia numa plataforma rendista, onde o poder inversor estrangeiro se faria com o controlo total de seu património, ao privatizar o poder creditício real, comutando para bancos privados (dependentes do poder financeiro ocidental) o planeamento económico, que deveria permanecer na posse do governo, se quisermos seguir avançando na agenda de emancipação continental.
África anda está para desenvolver em próxima agenda – ainda que as tensões provocadas no Centro do Continente – os desequilíbrios imensos no Norte (nomeadamente no Magrebe) e a baixa do petróleo, comodities, controlo do monopólio dos diamantes pelas companhias internacionais (a pesar da concorrência chinesa, que tem aberto alternativas novas), não permite ainda criar nem sequer uma ilusão de independência económica, mesmo nem no Sul continental. Lastres como a corrupção, em países dum poder geo-estratégico tão imenso como Sul África, complicam mais a situação, em favor duma agenda de unidade regional (já de por si muito complexa, pela difícil relação da Angola com Pretoria).
No Oriente Meio surgem as maiores incógnitas. Eis aqui onde o poder Ocidental, tem de evitar ambições de outras potencias regionais, como Rússia e China ou a Índia, dado serem esta região a ponte de transição dos três mercados mais rentáveis no nível global: energia, armas, drogas. Drogas e armas que normalmente vão associadas ao trafico de seres humanos. Segundo um relatório da Oficina de Crime e Droga, da ONU de 2012 – as máfias ilegais (que derivam dos três mercados) movem perto do 1,5% do PIB mundial, afirmando que o 70% destes ingressos são lavados através do sistema financeiro global.
Para consolidar o controlo desta região, o poder Norte Americano, tem trabalhado em vários relatórios sobre a necessidade de criação dum novo Oriente alargado – com supremacia relativa sunita, dos aliados do Ocidente. Mas sua implementação tem chocado com os interesses regionais de potencias menores como Turquia, Arábia Saudita, e potencias maiores como a Rússia, que tem intervido militarmente em defesa de seu aliado Bachar Al Assad, com um relativo sucesso.
Devido a esta situação tão poliédrica, os Estados Unidos, tem chegado a um acomodo razoável, sobre a situação Síria, dentro dum acordo global mais amplo que inclui ao Irão e Israel. Mas que não deve ter convencido muito aos sauditas e turcos... O Ministro de Assuntos Exteriores da Arábia Saudita, Al-Jubeir, bem de ameaçar a Bashar Al-Assad com uma intervenção militar direta na Síria, em caso este não abandone voluntariamente o poder (que se levaria a cabo desde território turco, onde já estão a ser concentradas tropas)... Turquia pela sua parte, bombardeia posições do exercito sírio, mas sobre tudo enfrenta diretamente às YPG curdas, pois a pesar da aliança curdo – norte-americana, os turcos não se fiam por causa dos estreitos laços entre YPG sírio e o PKK, turco...
A madeixa enreda-se cada vez mais... E tudo faz pensar que a tentativa de Serguei Lavrov e John Kerry (responsáveis de exteriores dos Estados Unidos e Rússia), de uma cessação de hostilidades, na Síria, pode ficar em águas de bacalhau... Arábia Saudita, que está a ver como na pratica seus aliados rebeldes estão sendo banidos do mapa pelo exercito sírio, graças ao poder da aviação russa, está a ficar muito nervoso, pela possibilidade de ficar fora do grande tabuleiro de xadrez, em que se converteu o Oriente Meio... No entanto o primeiro ministro russo em entrevista ao jornal alemão “Handelsblatt”, advertiu: “Os norte-americanos e nossos parceiros (referindo-se ironicamente aos árabes) devem pensar bem: querem mesmo guerra permanente?”
O problema duma guerra permanente, com implicação direta de protagonistas que antes estavam por trás do cenário – cada um ajudando a seu aliado – é, que nunca se sabe quando o confronto indireto, pode derivar em um confronto direto das potencias implicadas. Sabendo que Turquia pertence a NATO, não da muita confiança que uma frição de exércitos turcos, árabes e russo possa derivar em algo que ninguém, sendo sensato, desejar... Mas o ser humano tem demonstrado – por ativa e passiva – que em situação de medo, custa-lhe muito manter-se saudável mentalmente...
Pelo lado positivo, de momento Washington não se deixa pressionar pela Turquia, para que escolha entre os turcos e os curdos; a pesares de Erdogan ter conseguido excluir as YPG das negociações de Genebra.
A nomeação de Brett McGurk, como encarregue de lutar contra o Daesh (Califado Islâmico) pelo presidente Obama é uma boa noticia. O apaziguamento com o Irão, trás a queda de Ahmadinejad e a subida ao poder dum grupo menos anti-ocidental, tem facilitado uma reviravolta na Administração Obama, que agora mesmo tenta deitar fora da agenda o confronto regional xiita – sunita. Mesmo no Iraque, a colaboração dos EUA e os iranianos, fez-se cada vez mais evidente... Esse acomodo também poderia possibilitar uma paz entre as diversas facões curdas, que mesmo ameaçava com a cisão em dous da YPG Síria. Pelo lado negativo, isso alimenta o medo saudita, a ficar marginalizado.
Um acordo mais amplo, que incluía Irão, Turquia e Arábia Saudita, baixo supervisão de EUA e Rússia, tem de ser alcançado, para evitar o confronto... Mas ele será possível?