domingo, 17 de novembro de 2019

Uma questão de simbologia nacional


 
Bandeira do Reino de Galiza legal ate 1833

 Por: José Manuel Barbosa

Em 1607 foram criadas as Províncias Marítimas da Monarquia Hispânica por Real Cédula de Filipe III de Habsburg, as quais ainda existem atualmente dependentes do Mistério de Fomento mas baixo cujo governo esta um Capitão dependente, como funcionário, da Direção Geral da Marina Mercante espanhola.
Cada uma destas províncias tem uma, chamada, Contrassenha, quer dizer, uma bandeira com a que se reconhece a Província Marítima em questão. Estas bandeiras ou Contrassenhas foram criadas por Real Ordem de Isabel II o 30 de Julho de 1845 assinada pelo Capital Geral da Armada Espanhola e Ministro de Marina, Ramon Romay y Jimenez de Cisneros, nascido em Betanços e publicada pela Direção Geral da Armada em 4 de Agosto de 1845 na Gazeta de Madrid, antecessora do atual BOE. Nesse texto dizia que ao lado do "Pabellon Nacional" deveria figurar a bandeira ou Contrassenha indicativa da província marítima espanhola a que pertencia. Estas bandeiras seguiram o código de sinais marítimas internacional, aleatório e SEM QUALQUER SIGNIFICADO TERRITORIAL, segundo o texto originário, usando quatro cores: Vermelho, Azul, Amarelo e Branco. Esse código foi elaborado pelo na altura, Tenente da Armada Jose de Mazarredo Salazar em 1791.
Bandeira Galega do Graal atualizada
Se repararmos na inicial bandeira da Crunha veremos que esta é uma bandeira branca com uma aspa azul. Essa foi a bandeira ate 1891, ano em que se viu obrigado o governo espanhol a modificar a Contrassenha da Crunha por causa do pedido do governo russo ao governo de Isabel II, que considerava que a insígnia da Crunha era um decalque da bandeira da Marina Russa com o consequente incomodo que poderia ter para ambos Estados uma suposta confusão simbolológica. O governo espanhol aceitou entendendo que os barcos espanhóis provenientes do porto da Crunha e que navegavam por todos os mares onde tinha possessões territoriais (América, Filipinas, o Pacífico…) poderia ser confundidos com barcos russos, o que poderia ser um perigo potencial para o Reino da Espanha já que o Império Russo estava implicado em guerras tanto na Europa contra Turquia, os Balcãs, o Cáucaso (Mar Negro, Mediterrâneo, Atlântico) quanto na Ásia (Índico e Pacífico) com conflitos como o de Crimeia ou contra a China, ou o Japão no Estremo Oriente num projeto de expansao territorial que lhe desse saída aos mares cálidos.
Contrassenha da Província da Crunha a partir de 1845
Entre 1882 e 1895, chega ao Ministério de Assuntos Estrangeiros de Rússia o Diplomata Nicolai Girs que leva a cabo ações de concórdia e paz com as diferentes potencias internacionais. Com ele é que se faz o pedido de mudança de bandeira do porto da Crunha ao governo espanhol e é por meio do Decreto de 22 de Junho de 1891 publicado na Gazeta de Madrid (antecessor do BOE) quando o governo espanhol decide tirar uma das duas faixas dessa bandeira ou Contrassenha da Crunha. O texto diz:
"...para evitar las dificultades que puedan suscitarse, confundiendo la bandera del imperio ruso con la de la provincia marítima de La Coruña, se modifique esta última suprimiéndole una de las aspas, quedando por tanto reducida a una bandera blanca con faja diagonal azul (...) para evitar la confusión que se pueda dar entre la enseña del Imperio de Rusia y la de la provincia marítima de La Coruña".
A partir desse momento é que os galegos emigrados em América começaram a reconhecer os barcos provenientes do porto da Crunha pela bandeira branca com uma única faixa azul e foi assim que finalmente os galeguistas adotaram essa bandeira como a sua bandeira a pesar de que Manuel Murguia tivesse insistido na feição real da bandeira galega histórica.
Contrassenha da Crunha a partir de 1891
Chegados ao século XXI e a um grau de consciência nacional determinada, caberia pensar que uma bandeira criada por um governo de Madrid e reformada também pelo mesmo poder madrileno por pedido duma potencia estrangeira e no que os galegos não tiveram o menor protagonismo na sua criação, poderia ser aceite pelos galegos amantes da sua Nação? Caberia aceitar uma simbologia vexilológica surgida dum contexto político, 1845, em que a Galiza era identificada como uma "Colónia da Corte" em palavras de Antolim Faraldo uns meses depois, nas vésperas da Revolução de Abril de 1846? Caberia aceitar uma realidade simbólica surgida durante ao Reinado de Isabel II e por obra e graça do seu governo durante o processo de criacao do, até o momento inexistente Reino da Espanha, uma vez eliminado o histórico, primordial, veterano e matricial Reino da Galiza? Caberia aceitar um pavilhão para a Galiza que favorecia, afirmava e reafirmava uma Espanha de vocação nacional castelhana como Estado-Nação, negadora das realidades nacionais peninsulares, entre elas a Galiza? Caberia aceitar uma representação emblemática da Galiza nascida quando se começava a elaborar uma Historia da Espanha que hoje tanto criticamos e negadora do protagonismo da Galiza na Historia da Península e da Europa? Caberia assumir uma bandeira galega proveniente da época em que se começa a desligar a identidade da língua dos galegos ao resto do domínio galego-português?
Tínhamos bandeira e esta foi ilegalizada quando se ilegalizou o Reino da Galiza…. Agora há uma bandeira criada por quem ilegalizou a nossa bandeira histórica e originária do nosso Reino. Quantas das bandeiras "autonómicas" foram criadas pelo governo de Madrid? Quantas regiões ou nações do Estado conservam as suas bandeiras históricas? Pense-se e diga-se.
Por outra parte, acrescentamos o seguinte:
 

1- As bandeiras ou contrassenhas das províncias marítimas do Reino da Espanha foram criadas por Real Ordem de 30 de julho de 1845, assinada pelo Ministro da Marina, Capitão-General da Armada Espanhola, Ramón Romay y Jimenez de Cisneros. Foi publicada essa Real Ordem pela Direção Geral da Armada em 4 de agosto de 1845 na Gazeta de Madrid, que foi quando entrou em vigor. A contrassenha referida à Província da Crunha era branca com uma aspa de Santo André em azul. Assim é reconhecida, por exemplo, nas imagens que conservamos do Centro Galego da Havana dessa época, onde ondeia no alto do edifício funcionando como uma bandeira galega representativa da comunidade galega na ilha. Podemos comprovar a feiçao dessa bandeira no livro A. Bernal de O’Really: Prática Consular de España. Formulario de Cancillerias Consulares y Colección de Decretos, Reales Ordenes y Documentos diversos. Imprenta de Alfonso Lemane. Le Havre. 1864. Paginas: 2, 109 e 518

https://tinyurl.com/pregalicianflag

2- Por Real Decreto de 22 de Junho de 1891 publicado na Gazeta de Madrid, o Governo da Espanha decide tirar uma das faixas da aspa da contrassenha da Crunha, ficando uma bandeira branca com uma única faixa que vai do estremo superior esquerdo até o estremo inferior direito. As razões dadas no Real Decreto são aquelas que por pedido do Governo Russo pudessem causar confusão com a simbologia da Armada Russa, cuja bandeira é justamente branca com uma aspa azul, como a contrassenha da Crunha até o momento. O Real Decreto pode ser consultado na íntegra na página que o Ministério da Presidência da Espanha, dentro da página do atual BOE, dispõe para consultar a Gazeta de Madrid, antecessora do atual Boletin Oficial del Estado: https://tinyurl.com/Gazeta1891

3- Há uma referência que diz que a Bandeira galega tal e qual a conhecemos hoje, branca com uma faixa azul do canto superior esquerdo até o canto inferior direito, cruzando o campo vexilar, curiosa e exatamente igual do que a contrassenha da Crunha, legal desde junho de 1981, foi exibida pela primeira vez em maio de 1891, junto um mês antes da publicação do Real Decreto na Gazeta de Madrid, quando o corpo da nossa poetisa nacional foi transladado do cemitério de Padrão à sua localização atual, no Panteão dos Galegos Ilustres da Igreja de São Domingos de Bonaval.

4- Há várias dúvidas a respeito da criação da bandeira que para nós, são muito fáceis de responder: 1- A bandeira foi criada pelo galeguismo? 2- A bandeira foi obra de Murguia? Por que esse essa coincidência entre uma suposta criação galeguista e/ou de Murguia com a contrassenha da Província Marítima da Crunha?

Respostas:

A primeira referência no enterro de Rosália?

Da publicação da ordem de mudança nas aspas ( Junho de 1891) e o traslado do Corpo de Rosália a Bonaval, (maio de 1891) onde há referência do primeiro uso da bandeira da faixa única, não o enterro (1885), como se diz habitualmente e se confunde, vai um tempo aproximado de um mês. Antes foi o traslado, mas a iniciativa para modificar a bandeira e o aviso do Czar não deveram ser posteriores ao traslado dos restos de Rosália. Esse tipo de cousas levam tempo geri-las. São assuntos diplomáticos que com probabilidade já estavam falados, conversados, decididos e consumados, com muita probabilidade para evitar os conflitos que se poderiam derivar da confusão entre as bandeiras da Marina Russa e a bandeira espanhola da província marítima da Crunha, como também para evitar conflitos entre a Armada Russa e o Reino da Espanha. O pedido foi feito pelo Ministro do Czar, Nicolai Girs que tomou posse mesmo antes de morrer Rosália. Não nos parece que Murguia inventasse a bandeira da única faixa azul e que num prazo de quatro semanas o Ministério Espanhol da Marina decidisse copiar a bandeira desenhada por Murguia… ou no mais estranho dos casos, que fossem coincidir esteticamente de forma absoluta.

Mas, foi Murguia o autor?

Eu acho não ser um invento do Murgia. Como pode ser que independentemente de argumentos para si ou para não, não surpreenda a similitude 1° com a bandeira portuária da Crunha atual, em vigor desde 1891 e 2° A versão anterior a 1891 com a bandeira da Marina Russa da que sabemos, foi modificada para dar a atual? Não somos cegos.

Isso são provas... De ter sido Murguia o autor, nada temos que no-lo confirme, mas isso pode ser por duas razões: a- ou não foi ele ou b- não o deixou dito, no caso de ter sido ele... E porque não ia deixar claro que foi ele? Humildade? Qual foi o processo da elaboração da bandeira? Que documentação há? Pode alguém confirmá-lo? Não me parece que tivesse sido ele.

Murguia era historiador, e portanto, consciente de muitas cousas relativamente à memória coletiva... Que ia ganhar o galeguismo desconhecendo a autoria da bandeira em questão? Eu tenho a certeza de que como historiador que era, teria absoluta consciência, no caso de ter sido ele o autor, de que iria ser muito importante para os galeguistas do futuro, ter conhecimento do autor da bandeira. Não acerto a averiguar qual seria a razão pela qual Murguia quereria ocultar ou não dar a conhecer o seu suposto protagonismo.


Outras Contrassenhas dos portos galegos: 
Contrassenha de Ferrol  
Contrassenha de Lugo-Burela 
Contrassenha de Vigo
Contrassenha de Vila Garcia de Arouça


Referencias:


 


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