sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Caradawc, Caráunio, Corocota.... e outros nomes de resistentes celtas.


Foto de Tânia Costa: http://www.facebook.com/Nimphae?fref=ts

Por José Manuel Barbosa
Há uns meses comunicava connosco o Professor e Académico da AGLP Doutor António Gil. Ele comentava-me que estava a ler o NIMBOS de Diaz Castro em cujo poema 22 “O berro das Pedras” diz: “Írios ou ártabros, bergantinhos ou caránicos, ei!” para depois falar das Vacas de Breogão. O Professor Gil Hernandez perguntava-nos sobre esses assuntos e nós respondemos desde a nossa humildade mas sobre o tema continuei dando-lhe voltas e queria comentar qualquer cousa sobre isso, sobre tudo reparando na palavra “caráunicos” e certas cousas que conclui.

Para nós a forma “caráunico” talvez tenha a ver com Caráunios. Este é o sobrenome que recebia um dos líderes da resistência celtíbérica contra Roma. Na épica do cerco de Numância existe a figura heroica de Rhetógenes Caráunio, um guerreiro que conseguiu salvar o cerco romano para pedir reforços com o fim de conseguir atacar os romanos na sua retaguarda.


Ῥητογένης δέ, ἀνὴρ Νομαντῖνος, ᾧ Καραύνιος ἐπίκλησις ἦν, ἄριστος ἐς ἀρετὴν Νομαντίνων, πέντε πείσας φίλους, σὺν παισὶν ἄλλοις τοσοῖσδε καὶ ἵπποις τοσοῖσδε ἐν νυκτὶ συννεφεῖ διῆλθε λαθὼν τὸ μεταίχμιον, κλίμακα φέρων πτυκτήν, καὶ φθάσας ἐς τὸ περιτείχισμα ἀνεπήδησεν αὐτός τε καὶ οἱ φίλοι, καὶ τοὺς ἑκατέρωθεν φύλακας ἀνελόντες τοὺς μὲν θεράποντας ἀπέπεμψαν ὀπίσω, τοὺς δ' ἵππους διὰ τῆς κλίμακος ἀναγαγόντες ἐξίππευσαν ἐς τὰς Ἀρουακῶν πόλεις σὺν ἱκετηρίαις, δεόμενοι Νομαντίνοις συγγενέσιν οὖσιν ἐπικουρεῖν. 

"Rhetogenes, um numantino alcunhado Caráunio, o mais valente do seu povo, após convencer cinco amigos, cruzou sem ser descoberto, numa noite de neve, o espaço entre ambos exércitos acompanhado de outros tantos servos e cavalos. Levando uma escada dobrável e apressando-se até o muro que rodeava o cerco saltaram por acima dele e depois de matarem os guardiões de cada lado, enviaram de volta os criados e subindo aos cavalos pela escada, cavalgaram até as cidades dos arévacos com ramalhas de oliveira de suplicantes, pedindo a ajuda para os numantinos pelos laços de sangue que uniam ambos povos..." (Appianus Alexandrinus. Historia Romana. Ibérica. XCIV)

Esse sobrenome faz-me vir à cabeça o nome de dous personagens igualmente resistentes como foram Caradawc chefe duma confederação britana formada entre os Catavellani e dos Trinovantes e vencido por Roma na Batalha do Rio Medway. Posteriormente fugiu até a terra dos Brigantes, ao norte onde a rainha Cartimandua capturou e entregou Caradawc ao Imperador Cláudio perante o que se apresentou com espírito orgulhoso e ameaçador. Cláudio admirado da sua amostra de belicosidade ainda encadeado decidiu perdoar-lhe a vida.


Também o chamado de Corocota mencionado unicamente por Dião Cásio como um "um certo bandido em Ibéria" que se fez dele um suposto guerreiro cântabro que resistiu Roma nas denominadas Guerras Cântabras é outro dos nomes.

Dião Cássio diz-nos dele na sua “Historia Romana”:

Κοροκότταν γοῦν τινα λῃστὴν ἐν Ἰβηρίᾳ ἀκμάσαντα τὸ μὲν πρῶτον οὕτω δι' ὀργῆς ἔσχεν ὥστε τῷ ζωγρήσαντι αὐτὸν πέντε καὶ εἴκοσι μυριάδας ἐπικηρῦξαι, ἔπειτ' ἐπειδὴ ἑκών οἱ προσῆλθεν, οὔτε τι κακὸν εἰργάσατο καὶ προσέτι καὶ τῷ ἀργυρίῳ ἐκείνῳ ἐπλούτισε.

Era um ladrão chamado Corocotta, o qual surgiu em Ibéria quem o incomodou tanto (a Augusto, entende-se) ao principio que ofereceu duzentos cinquenta mil (entendemos denários) ao homem que o conseguisse capturar vivo; mas depois quando o ladrão foi a ele pela sua própria vontade, não só não lhe fez qualquer dano, mas em realidade o fez mais rico pela quantidade da recompensa. (Dio Cassius LVI, 43, 3)

Filme: Los Cántabros

Os cântabros-santanderinos de hoje fazem-no nativo da Comunidade Autónoma de Cantábria....quando em realidade não se diz que fosse cântabro mas um bandido da Ibéria, segundo a teoria de Schulten. Na altura os que estavam contra Roma eram bandidos e por isso tirou a conclusão de ser ele um chefe militar das tribos cântabras confrontadas contra o Império. O ser nomeado de bandido, muito comumente era por razões de oposição militar e política contra o Império. Neste caso poderia significar que o Corocotta do que falamos lutasse nas guerras cântabras  contra o Imperador Augusto, mas do nosso ponto de vista, estas atingiam territórios muito mais amplos do que a atual ou a velha Cantábria, nomeadamente, os territórios das atuais Galiza, o Norte de Portugal, Astúrias com Leão e também a Cantábria histórica... Dião Cássio fala dele como consequência da morte de Augusto acontecida em 14 d.C e nessa altura os únicos territórios sem pacificar da península são os citados.

Tanto Caráunio, como Caradawc como Corocota tem a ver com o nome que recebiam os chefes político-militares célticos e nomeadamente galaico-cantrabro-astures: Corono (os velhos, os respeitáveis...) mas também pode ter a ver com o labor de guia ou chefe militar ou tribal. Achamos o nome dum Lucius Corona Severus, soldado pertencente à Legio VII Gemina, numa inscrição achada em Astúrias. Fala-se-nos dela no libro “Legio VII Gemina (Pia) Felix. Estudio de una legión romana” escrita por Juan José Palao Vicente e publicado pela Universidade e Salamanca. Curiosamente os únicos lugares onde se têm achado epigrafia com nomes com esta raiz: Coroc..., Corocuta, Corocaudius, Corocaudi ou Croci é em zona linguística galaico-lusitana (ver mapa do Atlas Histórico da Galiza do qual sou co-autor) mas concretamente em Chaves, Bragança, Valpaços, Ujo (Astúrias) e Badalhouce.

Com certeza que o nome “Corona” “Coronia” ou “Coronha” poderia ter a ver com a origem da cidade da Crunha ou Corunha proveniente talvez dessa etimologia originária.


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