Por José Manuel Barbosa
O Ressurgimento
linguístico
Com a entrada
do exército francês na Galiza, o país vai começar a se espreguiçar depois de
três séculos de silêncio. A necessidade de chamar à gente à tropa para lutar
contra o francês faz com que o galego seja utilizado como um instrumento útil
para a captação mas também como instrumento literário. Fernández de Neiva,
Pedro de Andrade, Bento Fandinho ou Nicomedes Pastor Díaz são os primeiros a
redigirem textos na fala dos galegos embora muito vulgarizada e dialetizada.
Já expulsos os
franceses e já morto Fernando VI da Galiza e VII de Castela, a Galiza vai
deixar legalmente de existir como Reino. É em 1833 quando o Ministro de Isabel
II (4), Javier de Burgos cria quatro províncias com a mesma conexão entre si do
que qualquer delas com Almeria ou Cuenca, sem qualquer tradição histórica e com
uma dependência a respeito de Madrid como não se conhecia antes. Esta situação
faz movimentar o país em grupos contrários a esta repartição anti-histórica e
desestruturadora duma realidade de mais de catorze séculos de existência. Desde
agora só vai existir o Reino da Espanha, já mais nunca o Reino da Galiza. Com
isto, rangem as consciências dos galegos de cultura e surge o chamado
“Provincialismo”, movimento que visa a criação duma província única para salvar
a realidade política e administrativa galega. Este Provincialismo, primitiva
forma de galeguismo, conduz para um levantamento militar no 1846, denominado de
“Revolução de abril” sufocada pelo exército espanhol que acaba fuzilando os
seus lideres enquanto outros como Antolim Faraldo e Francisco Anhão vão poder
fugir para Portugal.
A frustração
política favorece uma saída cultural que deriva no cultivo da língua. São,
portanto, as primeiras personalidades deste galeguismo literário Rosália de
Castro, Eduardo Pondal e Curros Henriquez, cujas obras vão ser consideradas
clássicas das nossas letras contemporâneas embora a sua língua seja um reflexo
dos falares populares da altura histórica da que estamos a tratar, muito castelhanizados
e muito vulgarizados. Aliás, outros autores de grande importância são Lamas
Carvajal, Marcial Valladares ou Joám Manuel Pintos.
Os escritores da época, longe da tradição medieval e do
seu conhecimento, botam mão daquilo que
lhes é mais familiar: a língua mais castelhanizada no léxico, gramática,
morfologia, sintaxe e ortografia, ainda que contrariamente, os estudos
posteriores tenham descoberto, construções gramaticais, morfo-sintáticas e até
campos semânticos, na altura de uso comum, que mesmo servem para reafirmar as
teses regeneracionistas do idioma por serem estas formas, legitimamente
galegas, embora proscritas e mesmo proibidas da consideração como tais por
coincidirem com aquelas formas escolhidas como padrão em Portugal.
Nesta altura
histórica falamos num momento de preocupação a respeito da língua por parte dos
galeguistas, que atendem a problemática
do seu uso, vontade de correção e estudo. Saco e Arce, Cuveiro Pinhol, ou
outros, publicam gramáticas, dicionários e tratados sobre as suas recolhas de
léxico. A Galiza, pobre economicamente e atrasada culturalmente produz mão de
obra para América. Os episódios da
emigração são comuns durante esta época embora o sentimento pátrio faça com que
também enxerguem ali, onde há cultura, o cultivo do pensamento relacionado com
o país.
As
preocupações nacionais traduzidas dum ponto de vista social e político recebem
o nome de “Regionalismo”, sendo o marido de Rosália de Castro, Manuel Murguia o
teórico do galeguismo mais comprometido.
Murguia só
conta com a concorrência do também pensador Alfredo Vranhas, que parte de
pressupostos mais “politicamente corretos”, quer dizer, menos comprometidos,
até ao ponto de ser ele o fundamento do “galeguismo” oficial da Galiza
autonômica dos fins do século XX e começos do século XXI sob governos não
herdeiros do galeguismo histórico mas do franquismo mais anti-galeguista.
Texto
Probe Galicia, non debes
chamarte
nunca española,
que
España de ti s´olvida
cando
eres, ay! tan hermosa.
Cal
si na infamia naceras,
torpe,
de ti se avergonza,
y a nai que un fillo despresa
nai sin corasón se noma.
Naide porque
te levantes
che
alarga a man bondadosa;
naide
os teus prantos enxuga,
y
homilde choras e choras.
Galicia,
ti nos tes patria,
ti
vives no mundo soia,
y a prole fecunda tua
se espalla en errantes hordas,
mentras triste
e solitaria,
tendida
na verde alfombra,
ó mar esperanzas pides,
de Dios a esperanza imploras.
Por eso anque en son de festa
alegre á
gaitiña se oia,
eu
podo decirche:
non
canta, que chora.
Rosalia
de Castro: Cantares Gallegos
A Fala
Nobre e armonïosa
fala
de Breogán,
fala
boa, de fortes
e
grandes sin rival; ti do celta aos ouvidos
sempre
soando estás
como
soan os pinos
na
costa de Froxan;
ti
nos eidos da Celtia
e
co tempo será
un lábaro sagrado
que
ao trunfo guiará,
fala nobre, armoniosa,
¡fala
de Breogán!
Ti,
sinal misterioso
dos
teus fillos serás
que plo mundo dispersos
e sin abrigo van;
e a aqueles
que foran
nunha pasada edá
defensores dos eidos
contra
o duro román
e
que ainda cobizan
da
terra a libertá,
nun
pobo nobre e forte,
valente,
axuntarás,
¡oh,
fala armonïosa,
fala
de Breogán!
Serás
épica tuba
e
forte sin rival,
que
chamarás ós fillos
que
aló do Miño están,
os
bós fillos do Luso,
apartados
irmáns
de
nós por un destino
envexoso
e fatal.
Cos
robustos acentos,
grandes,
os chamarás
¡verbo
do gran Camoens,
fala
de Breogán!
Eduardo Pondal. Queixumes dos pinheiros
O século XX na Galiza (até 1950)
O mundo da
política vê aparecer as agrupações de caráter galego e galeguista, e mesmo de
defesa da língua face ao castelhano. Começam portanto as disputas entre os
seguidores dum achegamento ao português e aqueles outros que defendem qualquer
forma de isolacionismo.
Em 1902 o
governo emite um Real Decreto que pune os mestres que ministrem as aulas em
galego e no entanto o galeguismo cria a Real Academia Galega em 1906, o jornal
“A Nossa Terra” em 1907, e as
Irmandades da Fala em 1916 com finalidades galeguizadoras, chefiada por
personagens de grande importância durante o século que agora começa: Vicente
Risco, Vilar Ponte, Castelao ou Outeiro Pedraio...Os primeiros
parecem seguir critérios mais ilustrados e cientifistas do ponto de vista
filológico-linguístico embora os segundos aceitem um populismo que quer ser
mais pragmático e melhor aceitado pelo “stablishment” político-cultural. O
século XX vai ser especialmente importante porque vai ser quando se reivindique
a língua dos galegos com muita mais força do que no passado, mas em troca, vai
ser quando a perda de falantes vai ser mais evidente.
As Irmandades
da Fala em 1918 declarar-se nacionalista ao considerar a Galiza como uma Nação
por possuir todos os condicionantes para ser considerada como tal. O fim da
Primeira Guerra Mundial, a independência de muitos países do Leste da Europa
sob poder austro-húngaro, turco e/ou russo,e a criação da Sociedade das Nações
que propunha a aplicação dos catorze Pontos de Wilson têm muito a ver com tudo
isso.
Os próprios
galeguistas de começo do século e nomeadamente o grupo de Ourense vão criar a
revista “Nós” cujo labor em favor da cultura galega, é fundamental para
percebermos o galeguismo do século XX. O seu campo de investigação abrange tudo
aquilo que possa ser definido como galego, num labor imenso de recuperação
etnográfica, históriográfica, geográfica, artística e linguística até. Cria-se
o Seminário de Estudos Galegos dedicado ao estudo da língua, onde se vão dar os
primeiros desencontros entre os favoráveis à convergência com o resto da
lusofonia/galeguia e os que posteriormente serão denominados de isolacionistas
ou elaboracionistas.
Politicamente
a etapa é muito interessante por ser a primeira vez que houve uma representação galeguista importante no parlamento
espanhol de Madrid. É a Segunda República espanhola nascida em 1931 que vê uma
representação galega nas Cortes Espanholas levada pelos dois partidos políticos
galegos da altura. A ORGA (Organização Republicana Galega Autónoma) e o PG
(Partido Galeguista).
Do grupo das
Irmandades da Fala da Crunha sai em setembro de 1929 um partido político de
pendor galeguista conservador, a ORGA (Organização Republicana Galega Autónoma)
que vai chegar no seu momento a pôr um político galego, Santiago Casares
Quiroga, na chefia do governo republicano espanhol em maio de 1936. Mas é na
Assembleia de Ponte Vedra em 1931 que as Irmandades decidem organizar o Partido
Galeguista de feliz memória para a história recente do nosso País. Entre ORGA
-que passa a denominar-se posteriormente Federação Republicana Galega (FRG) e
mais tarde Partido Republicano Galego (PRG)-, o PG e outros deputados galegos
compõem o grupo parlamentar Minoria Galega do Congresso com 19 deputados que
serão os que elaborem o Projeto de Estatuto de Autonomia de 1936.
O PG por seu lado vai dar grandes vultos como Daniel
R. Castelao, Outeiro Pedraio, Alexandre Bóveda..., que serão quem conquistem o
primeiro Estatuto de Autonomia da Galiza. Eles é que vão participar na
elaboração e conquista para a Galiza do Estatuto aprovado em junho de 1936,
pouco antes do levantamento fascista do mês de julho.
A guerra frustra toda a tentativa de autogoverno
exercendo uma repressão brutal contra o nacionalismo galego que vê morrer a
muitos dos seus dirigentes -como no caso de Bóveda ou Casal- ou vê o exílio de
outros como o caso de Castelao. Dentro da Galiza o PG fica desfeito e em mãos
de dirigentes, ameaçados pelo poder e com risco das suas vidas. Perante isso,
optam pela dissolução do partido evitando com isso a vantagem futura duma
organização clandestina que poderia favorecer a recuperação do partido quando a
ditadura chegasse ao seu fim.
O General Francisco
Franco, alça-se em rebeldia contra a República legalmente constituída dominando
a Galiza desde os primeiros meses. Os franquistas assassinam a todos aqueles
opositores que se tivessem distinguido por defenderem os interesses e as ideias
galeguistas bem como outros pensamentos políticos sempre contrários aos
golpistas. Muitos dos galeguistas, lembrando a situação do 1846, fogem da
Espanha, desta vez para a América onde se organizam. Enquanto na própria
Galiza, a desgaleguização dos modos de vida e a imposição do castelhano tornam-se
brutais. Os meios de comunicação e os métodos de controlo de massas incluída a
rádio e a TV criadas desde os anos 50 levam a única língua oficial do Estado às
moradas dos galegos às escolas, à igreja e à vida de algumas cidades que vivem
a perda da sua galeguidade pouco a pouco
.
Sabido é por
todos que o galeguismo na Argentina é o que vai manter o lume acesso da defesa
do país e da língua em mãos do liderado de Daniel Castelao quem no seu livro
“Sempre em Galiza” marca as linhas a seguir no futuro duma possível queda do
poder político anti-galego. Castelão morre em Buenos Aires em 1950 defraudado e
desiludido pelos factos acontecidos tanto internacionalmente como dentro da
Galiza e do Estado Espanhol. Haverá que aguardar a morte do ditador para ver
que acontece com a Galiza...
Textos
A fala
galega
Na
Península Ibérica, desprendéronse do baixo latín medieval tres lingoas romances
que inda hoxe a dividen en tres bandas verticaes (ficando ó Norte o angulo
euskérico).
Valle-Inclán carauterizounos cunha xenial comprensión
da índole social dos pobos das tres falas: “Tres romances se formaron na Península
-di-: catalán de comerciantes, galego de labradores e castelao de dominadores”.
Está recoñecido por cantos se ocupan destas cousas,
que, de tódolos vínculos sociaes, é a fala a que máis sopara e carauteriza ós
pobos, porque é o máis espirtual de todos, é o que conforma o pensamento e fai
a maneira de ser das xentes. O troque de língoa determina, na maor parte dos
casos, a dexeneración espirtual dun pobo. A Cuestión é deferente prós individos
do que prás nacionalidades. A proba é que a imposición da língoa foi sempre
unha violencia que non descoidou ningún imperialismo: foi empregada por Austria
cos checos e cos húngaros, por Prusia cos polacos, por Francia cos vascos i os
provenzaes, por Castela cos catalás e connosco.
Mais a pesar da rabia conque o presiguen, o galego
vive, fálase polas catro quintas partes da poboación, i achase hoxe nunha das
súas épocas de maor frolecemento literario, convertíndose en istrumento de
espresión centífica e de produción filosófica.
Agora,
o galego i o portugués son dúas formas dialeutaes do mesmo idioma: esto indica
que nós temos un maor parentesco con Portugal do que con Castela. Tres falas,
tres civilizaciós; nós pertencemos á civilización da banda oucidental, e
culturalmente, pois que esí é filolóxicamente, nada temos que ver coas outras
dúas. Queiramos ou non, esto trábanos fortemente, estreitamente con Portugal e
coa civilización portuguesa.
Vicente
Risco .Teoria do nacionalismo galego.1920
Texto
A terra galega é, ao mesmo
tempo, unha entidade étnica, pero de dificultosa reconstrución política, porque
a fronteira portuguesa róubanos a espranza de anovar en breve a comunidade
nacional dos tempos suevos e visigóticos. Con todo, é doado esperar que o
Bierzo e demáis comarcas limítrofes de Ourense e Lugo, se incorporen ao seo da
súa nación natural, e que o tempo -gran curandeiro dos erros hestóricos-
posibilite a reconstrución total da nosa unidade. Non se pode creer que o rio
Miño, vello pai de Galiza -representado na franxa azul da nosa bandeira- siga
sendo un lindeiro perdurable de dous Estados.
Galiza é a mellor esquina do solar hispánico, cabo do
mundo antigo e avanzada de Europa no mar inmenso da liberdade. A arquiteitura
barroca do noso chán, labrada en pedra granítica, está sempre coberta por un
manto de zugoso verdor. Os montes son redondos como peitos de muller e as
serras son como lombos de boi cebado. Os vals son ledos e farturentos. O mar
tolea de carraxe cando non-o deixan penetrar na terra; pero cando entra,
quédase adormecido no leito das rias. Galiza é unha unidade territorial
armónica, de formas e coor, perfeitamente diferenciada do resto da Hespaña.
Un fillo de Galiza pode iñorar que o seu idioma
labrego e mariñeiro (“rustico”, como din os catedráticos casteláns), fose
antano a língoa lírica de toda Hespaña; pero non hai galego que non se sinta orguloso de ser
fillo da terra mais fremosa do mundo. Cando un galego entra nas planuras de
León ou de Zamora, síntese en terra allea, invadido pol-a tristura que producen
os desertos. Cando entra en Asturias ten que afacer os seus ollos a un novo
estilo de paisaxe. Pero cando traspón a fronteira portuguesa, síntese na
propria terra, e non dá creto ás arbitrariedades da política hestórica.
Castelao. Sempre en
Galiza. Cap. V. Livro 1º.
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